sexta-feira, setembro 29, 2006

Porque não resisto

o teu rosto à minha espera. o teu rosto
a sorrir para os meus olhos. existe um
trovão de céu sobre a montanha.

as tuas mãos finas e claras. vês-me
sorrir. brisas incendeiam o mundo.
respiro a luz sobre as folhas da olaia.

entro nos corredores de outubro para
encontrar um abraço nos teus olhos.
este dia será sempre hoje na memória.

hoje compreendo os rios. a idade das
rochas diz-me palavras profundas.
hoje tenho o teu rosto dentro de mim.


José Luís Peixoto, A Casa, A Escuridão

Bordado e Vinho Madeira na SIC Notícias


O Bordado e o Vinho Madeira vão estar em destaque no programa “Imagens de Marca” da SIC Notícias, que tem uma audiência qualificada de gestores e quadros de empresa. A estreia está prevista para amanhã, pelas 12h30, com repetição, no domingo, às 9h30 e às 17h30.

O sector tem registado ultimamente acções significativas, tais como a presença do Bordado no “New York Home Textile Show”.
Considerando a relevância do Bordado Madeira e todas as acções que recentemente estão a ser desenvolvidas pela Secretaria Regional do Ambiente e dos Recursos Naturais, através do Instituto do Vinho, do Bordado e do Artesanato da Madeira, o canal de televisão SIC Notícias, através do seu programa “Imagens de Marca”, produziu, durante as últimas duas semanas, um programa completamente dedicado à Região e aos seus produtos imagem de marca. Assim, amanhã, pelas 12h30, (com repetição no domingo, às 9h30 e às 17h30), irá para o ar este programa especificamente dedicados a produtos de prestígio assumidos por todos como imagem de marca da Região. Neste programa, o bordado Madeira terá um forte destaque, proporcionando uma visibilidade nacional ao projecto de modernização, bem como o Vinho Madeira, outro produto de prestígio que terá presença nesta emissão televisiva.
In Jornal da Madeira, 29.09.06

Outono

Hoje esteve um dia típico de Outono. Choveu de manhã, depois o Sol ainda piscou o olho a umas quantas nuvens, mas... nada, - nuvens ao poder! Esteve um dia cinzentão, um daqueles tão cinzentos, tão cinzentos, tão cinzentos em que é de todo impossível não ficar com a neura... A não ser que se lhe comece a achar piada, como que por milagre (!), e se tenha, claro, milhentas aulas para ir, outros tantos artigos para ler, um paper para escrever, uma conferência para assistir e uma recepção pós-conferência para co-organizar e consequentemente dinamizar (leia-se: socializar).
Principais vantagens de se ter um dia particularmente agitado: imunização a neura, perda drástica de apetite (com as consequencias óbvias para a linha!), muitos sorrisos (alguns de surpresa, outros de admiração - para não variar), comentários (muito, demasiado até!) positivos ao trabalho desenvolvido...
Principais desvantagens de se ter um dia particularmente agitado: dores de costas, dores de cabeça, dores nos olhos, olhos a arder, (auto)tolerância/paciência diminuta, e uma sensação de cansaço tão surreal que não me está a deixar adormecer...
Então vim para aqui e li isto
e revi-me em tantas situações, noutras não de todo, mas senti-me como a imagem que postei acima e pronto veio-me o sono. Foi isso. Não ando a fazer muito sentido. Ultimamente. Mas ando a achar piada ao cinzento dos dias... Continuo sem fazer sentido, acho. Há-de passar. Ou não. Acho que vou dormir. Finalmente.

quarta-feira, setembro 27, 2006

Ódios de estimação (II)

Thierry-Henry
planetfoot.tripod.com

"(...) em dez jogos com o Arsenal o FC Porto neste momento perde nove. A diferença é muito grande e isso viu-se ontem à noite no Emirates Stadium. Henry metia medo sozinho, marcou um golo e deu outro." CM, 2006-o9-27

Já não bastava ser franciú. Não. E bonito. Não. E excelente jogador. Não. Não chega. Não? Não! Há que levar sempre com ele e assistir ao mesmo espectáculo quase invariavelmente: ele a atravessar o nosso caminho e a levar geralmente a sua avante!

GGGGGGGGRRRRRRRRRRRRRHHHHHHHHHHHHHHHHHHH!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

terça-feira, setembro 26, 2006

Romance ingénuo de duas linhas paralelas

Duas linhas paralelas
Muito paralelamente
Iam passando entre estrelas
Fazendo o que estava escrito:
Caminhando eternamente
de infinito a infinito

Seguiam-se passo a passo
Exactas e sempre a par
Pois só num ponto do espaço
Que ninguém sabe onde é
Se podiam encontrar
Falar e tomar café.

Mas farta de andar sozinha
Uma delas certo dia
Voltou-se para a outra linha
Sorriu-lhe e disse-lhe assim:
"Deixa lá a geometria
E anda aqui para o pé de mim...!"

Diz a outra: "Nem pensar!
Mas que falta de respeito!
Se quisermos lá chegar
Temos de ir devagarinho
Andando sempre a direito
Cada qual no seu caminho!"

Não se dando por achada
Fica na sua a primeira
E sorrindo amalandrada
Pela calada, sem um grito
Deita a mãozinha matreira
Puxa para si o infinito.

E com ele ali à frente
As duas a murmurar
Olharam-se docemente
E sem fazerem perguntas
Puseram-se a namorar
Seguiram as duas juntas.

Assim nestas poucas linhas
Fica uma estória banal
Com linhas e entrelinhas
E uma moral convergente:
O infinito afinal
Fica aqui ao pé da gente.

José Fanha

segunda-feira, setembro 25, 2006

Wouldn't It Be Nice

* Malásia.Net


by Brian Wilson - Tony Asher

Wouldn't it be nice if we were older
Then we wouldn't have to wait so long
And wouldn't it be nice to live together
In the kind of world where we belong

You know it's gonna make it that much better
When we can say goodnight and stay together

Wouldn't it be nice if we could wake up
In the morning when the day is new
And after having spent the day together
Hold each other close the whole night through

Happy times together we've been spending
I wish that every kiss was never ending
Wouldn't it be nice

Maybe if we think and wish and hope and pray
It might come true
Baby then there wouldn't be a single thing we couldn't do
We could be married
And then we'd be happy
Wouldn't it be nice

You know it seems the more we talk about it
It only makes it worse to live without it
But let's talk about it
Wouldn't it be nice


Beach Boys
* Malásia: "(...) o outro lado do mundo que é dentro de nós mesmos".

domingo, setembro 24, 2006

Em todos os jardins

Orquídeas_Web


Em todos os jardins hei-de florir,
Em todos beberei a lua cheia,
Quando enfim no meu fim eu possuir
Todas as praias onde o mar ondeia.

Um dia serei eu o mar e a areia,
A tudo quanto existe me hei-de unir,
E o meu sangue arrasta em cada veia
Esse abraço que um dia se há-de abrir.

Então receberei no meu desejo
Todo o fogo que habita na floresta
Conhecido por mim como um beijo.

Então serei o ritmo das paisagens,
A secreta abundância dessa festa
Que eu via prometida nas imagens.


Sophia de Mello Breyner Andresen,
(1919 - 2004)
"Poesia I", 1944

sexta-feira, setembro 22, 2006

As singularidades da caixinha mágica

Lcds_google
Lia há pouco um blog daqueles de passagem obrigatória diária*, que por acaso nunca comentei, mas ao post de hoje** não resisti...
A enormidade da semana. Para mim.
Laços que se mantêm à distância anos a fio, vida fora, mantêm-se a cuspo e à primeira adversidade/impossibilidade de escolha desfazem-se em cinza.

Na casa dos meus pais temos TV Cabo, mas só há uma televisão. E por muito que se passe, passemos os quatro, o dia a mudar de canal (é o mal de ter TV Cabo!), à noite, quando eles chegam e somos um, perdão, somos seis (!), vemos todos o programa da RTP1 que eles costumam ver (é o resultado de se viver na Madeira e de até há bem pouco tempo terem acesso a RTP1 apenas!)

Ser uma família é isso mesmo: ceder, respeitar, partilhar momentos e conviver...
Por outro lado, também tenho que admitir que não somos uma família "normal": família "numerosa": seis (apesar de nós os quatro estarmos fora e na Madeira permanecerem somente os pais), quatro universitários de áreas tão diversas como as Humanidades, a Medicina e a Música, com gostos e percursos tão diversos e diferentes do usual que... enfim: uma coisa é certa quando vamos para casa nas férias temos tempo para sair com os amigos, ver os nossos programas de TV, divertirmo-nos e isto sem deixar de estarmos todos juntos às refeições e discutirmos os problemas do dia-dia à mesa e, claro, vermos a "Herança de Verão"!
*
http://sapatospretos.blogspot.com/
**
http://www.negocios.pt/default.asp?SqlPage=Content_Opiniao&CpContentId=282520

quinta-feira, setembro 21, 2006

O Príncipe, o Bruno e o Blog

Bruno_Yahoo

Há dias estava a falar da filmografia do Manoel de Oliveira com as "cinéfilas" do Departamento. Isto porque às sextas feiras temos Cinema no Departamento, dois filmes, um regra geral europeu (de produção independente…) e o outro Americano (mas alternativo, o que neste caso significa bom, não de todo hollywoodesco!...)
Uma é da Hungria e a outra do Alasca e, por muito que goste a arte e admire o cineasta luso, tinha (e tenho ainda) algum pejo em sugerir um filme dele a alguém “verde” em Manoel de Olveira.
(Em Houston, leia-se Net flix e Blosckbusters e afins inclusive – e portanto, a ver pela World Wide Web, nos EUA em geral –, cinema português é Manoel de Oliveira e o resto é paisagem, a boa maneira queiroseana. Para desconsolo meu, apostada que estava em maravilhar a plateia com o “Coisa ruim” do Tiago Guedes!...
- Pois… mas se calhar é melhor não, porque… porque… bem, porque… porque a arte dele não é gratuita e a maior parte das pessoas não se rende, não fica presa à primeira, vai-se deixando prender… aprende a gostar!... – acabei por dizer. Mas fiquei com um vazio apertado no peito. E uma vontade de fugir dali o mais rápido possível para pensar.
A maior parte das pessoas aprende a gostar. Aprende-se a gostar? Ou gosta-se (ou não) e pronto!? Fiquei a matutar nisto quando, após termos deixado a discussao em banho-maria, decidimos ir cada uma à nossa vidinha. Fui para o gabinete. Petrifiquei. Ante o computador e a enormidade proferida. Será que aprender a gostar (em todas as acepções e a todos os níveis) é gostar de facto, em profundidade, com paixão e loucura do que quer que seja? Ou é aquela coexistência pacífica, fria e sensabor, que costumamos imputar a relacionamentos com dezenas de anos de existência?
Se fosse generativista dividia já esse 'Gostar' em Gostar nº1 e Gostar nº2. É muito fácil assim. Então, o Gostar nº1 é apolíneo, claro, simples, racional(izável) e portanto “aprendível”; o Gostar nº2 é aquele voluptuoso, físico, que nos vira do avesso e deixa a vida completamente ao contrário, gera o caos e por isso a maior parte das vezes é doloroso, certamente não “aprendível”! There you are! Simples, não é?
Não. Todos sabemos que não. Eu sei que não. E, além do mais, sou cognitivista. O cérebro é que tem a resposta. Esta e muitas outras. O cérebro é o futuro. E apesar de estar a ser estudado por cérebros idênticos – o que atrasa inevitavelmente o estudo!* – tem-se mostrado absolutamente revelador da maneira como encaramos o mundo, conceptualizamos a realidade, enfim: pensamos, agimos e vivemos. Então Gostar só há um, trata-se de um sentimento/uma emoção apenas. Uma. Só. Enorme, abstracta, congregadora de muitas conjunturas, contingências e detalhes, de grande e pequena monta, que determinam a intensidade dessa emoção e subsequentemente, a denominação da mesma: ‘amor’, ‘amizade’, ‘afeição’, ‘ódio’, ‘desprezo’, ‘nojo’… É tudo uma e a mesma coisa. Tudo um gostar. Acho.

Ontem descobri por acaso o blog do Bruno Nogueira.
O Bruno Nogueira é aquele miúdo altíssimo e magrinho que, quando apresentava o Curto Circuito, entupia as linhas telefónicas, tal era a legião de fãs, melosas, divertidas, histéricas aos berros (só falava ouvir-se arrancarem os cabelos, algumas). Aquele miúdo que faz stand-up e, invariavelmente, seja quando diz umas piadolas, seja quando ouve uma declaração de amor em directo ou um elogio profissional, está sempre muito sério, estranhamente, surpreendentemente, assustadoramente sério… Aquele miúdo… o Melman do Madagáscar, o Bin-Laden das Manobras… o… o… Aquele miúdo que apresentava O Pior Condutor de Sempre, aquele programa em que, dizem, se fartava de gozar com o interlocutor, fosse quem fosse, velho ou novo, rapaz ou rapariga… Aquele miúdo que, dizem, é um fedelho, arrogante e malcriado, com a mania do vedetismo.Aquele miúdo que, dizem, anda não sei com quem… Aquele miúdo que, dizem, … Aquele miúdo que, dizem, …
Aquele miúdo que me fazia lembrar o Príncipe. O cabelo, as sapatilhas, a t-shirt cor de laranja, o relógio. Era igualzinho. Então, foram as semelhanças ao Príncipe – um dia destes conto-vos a história do Príncipe – que me levaram, há uns anitos já, até ao Bruno, quais asinhas nos pés de Mercúrio. Daí até a suprema inteligência e a acutilância subjacente às piadas me conquistarem foi um ápice. Instantâneo. Natural. Como toda a Arte deve ser. Como toda a Arte é. Genial!
Nunca ninguém, à excepção do meu irmão – genuíno apreciador do BOM humor que se vai fazendo em Portugal, me deu crédito por gostar do Bruno Nogueira. Por causa do Príncipe. E eu a desdobrar-me em explicações e a fazê-los entender que o Príncipe estava guardado, engomadinho e bem dobrado, numa das gavetinhas do inconsciente do Contador Antropomórfico de Dali que todos temos, e que o Bruno não era de todo substituto emocional do Príncipe, nem sequer placebo para alguma réstia de maleita “cardíaca”. Mas nem assim.
Nunca ninguém, à excepção do meu irmão – genuíno apreciador do BOM humor que se vai fazendo em Portugal, me deu crédito por gostar do Bruno Nogueira. Por causa do Bruno. E eu a esgrimir argumentos que nunca mais acabavam, numa clara tentativa de converter toda a gente ao “culto”, porque as pessoas tímidas passam muitas vezes por convencidas, saber de uma vida de experiência feito, e o génio... o génio é universal e objectivamente verificável e comprovável. Mas não, não chegava. Não era o bastante. Tímido não seria. Génio talvez. Arrogante, sem dúvida.
Ontem descobri-lhe o blog. Por acaso. Sem querer. Num dos habituais périplos por todas as estações e apeadeiros cibernéticos de amigos, conhecidos, desconhecidos, amigos de amigos, amigos de conhecidos e de desconhecidos. Já era tarde. Já era muito tarde. O corpo pedia descanso e os olhos embaciavam-se de tanto arderem. Já era tarde e não consegui parar de o ler. Li-o todo. Um ano e tal de posts.
Podem atirar-me com a curiosidade insaciável do voyeur, com a gula incontrolável do obeso, com a sede do desidratado, com a ânsia desmesurada que o povinho pequenino do nosso país, ainda mais pequenino, tem em querer saber a vidinha dos famosos, as festas, os flirts, os podres, o que se lhes passa na cabeça, se têm alguma coisa na cabeça… Podem, se calhar até foi isso, ou a soma de tudo isso, no início… depois foi aquela sensação de calor lânguido que apazigua o espírito e dá descanso ao corpo. A sensação que as certezas dão à mente, à alma da gente. A certeza de gostar de uma grande pessoa. Uma pessoa com valor. E valores.
O Bruno Nogueira é aquele miúdo que..., do alto dos seus 194 cms, está a crescer. Pessoal e profissionalmente. De uma forma muito bonita.
(Reflexo imediatamente após a leitura: enviar a todos o link para o blog do Bruno. Vão passar a gostar? Vão aprender a gostar? Vão gostar? Não sei. Não me interessa. Afinal, ‘gostar’ e ‘não gostar’ é uma e a mesma coisa.)

quarta-feira, setembro 20, 2006

A Linguística no dia-a-dia

"Se durar o suficiente, qualquer discussão acaba na semântica."

Lei da retórica de Hartzin
A Lei de Murphy, vol. III

terça-feira, setembro 19, 2006

"Ahoy, me hearty!"

Cap'n Slappy (left) and Ol' Chumbucket (right)
International Talk Like a Pirate Day is a parodic holiday invented in 1995 by two Americans, John Baur ("Ol' Chum Bucket") and Mark Summers ("Cap'n Slappy"), who proclaimed September 19 each year as the day when everyone in the world should talk like pirates. For example, instead of "hello", an observer of this holiday would greet his mates with "Ahoy, me hearty!"
The date was selected because it is the birthday of Summers' ex-wife and would consequently be easy for him to remember.
Americanices!...
Mais na Wikipedia.

segunda-feira, setembro 18, 2006

As Vindimas


Este fim-de-semana fez-se a Vindima na minha casa. E isso trouxe-me à memória muitas e boas recordações da minha infância e da Madeira. Muitas e boas, as melhores talvez …
Começávamos na tarde de sexta-feira, quando os meus pais chegavam dos respectivos empregos e a animação, a azáfama e a alegria duravam até o início da tarde de Domingo, altura em que se provava o mosto e se deixava as uvas a prensar um pouco mais no Lagar… Um fim-de-semana inteirinho com o melhor que a vida rural tem (e isto a cinco minutos do Funchal, maravilhas de se viver numa ilha!…).
Vivi desde sempre com os meus avós e em vida destes, ou melhor, em vida do meu avô, colhíamos as uvas tanto do terreno onde fica a nossa casa, como do outro terreno, onde fica a casa do meu tio. A mim nunca me pareceu que tivéssemos muitas uvas, coisa pouca, meia dúzia de latadinhas - segundo o meu avô, mas o facto é que depois de enchermos a três pipas da nossa adega - para consumo interno como é típico de qualquer actividade económica de subsistência -, sempre vendíamos vinho e em proporções se não maiores, idênticas.
Na Madeira as uvas são cultivadas em latadas. Não faço ideia de onde poderá ter surgido o termo, nem tão pouco consigo estabelecer qualquer analogia com “lata”. O que acontece efectivamente é que a vinha é cultivada (e cresce) não a partir do solo mas estendendo-se ao longo de uns varões que se colocam normalmente abaixo do nível do telhado numa espécie de alpendre, pelo que além do cheiro doce com que brinda quem quer que saia à porta, a vinha a todos se oferece em sombra e frescura.
Na Madeira também, o tipo de uva cultivada diverge substancialmente da do continente. Assim sendo, nas quatro latadas da minha casa cultivamos três tipos: uva americana, canim e jaqué. (Tenho algumas dúvidas em termos ortográficos, no que se refere à última. Perdoem-me os entendidos.) A uva americana é bastante conhecida: de bago grado, miolo claro, é muito doce. Já se me perguntarem a diferença entre o canim e o jaqué, além do sabor, mais ácido num, mais doce noutro; e da configuração exterior, cacho de bagos que rareiam num, mas que abundam quase tornando uno o outro - pouco mais lhes sei dizer. Aliás, nem tenho bem a certeza quais os atributos que pertencem a qual. E isto porque, na minha casa, as Vindimas não eram para mulheres ou crianças.
Na verdade, nos tempos do meu avô, mulheres e crianças, se quisessem ajudar, juntavam bagos. Os bagos que os cavalheiros ao podarem (é esse o termo, lembrei-me!) a vinha, porventura, deixavam cair. Ou melhor, os cachos é que, de tão maduros, não conseguiam conter os respectivos bagos … Então as senhoras e a prole estavam sempre por ali, mas para essa tarefa menor e sensabor. Para isso, para se desdobrarem nas últimas ofertas de uns poucos cachinhos a alguma vizinha mais próxima e para a degustação do mosto no Domingo. (Outra coisa absolutamente prescindível para mim por ser demasiado doce para o meu paladar.) As crianças podiam ainda pisar as uvas. Acho que era o ponto alto do fim-de-semana para o meu irmão e para as minhas irmãs. Não para mim. Enfim… E lá andavam, felizes e contentes, a apanhar os bagos do chão. Mas eu, eu não. Apanhar bagos não era definitivamente comigo: além de me dar cabo dos joelhos e das costas, não tinha piada nenhuma! Então certa vez, às escondidas do meu avô (claro!), agarrei nuns três baldes (até aqui nenhum problema), “desviei” um podão (i.é. instrumento com que se cortam os cachos de uvas) e comecei a podar feito gente grande (do sexo masculino) numa latada mais afastada das restantes, no terreno do meu tio. Não me lembro que idade tinha, mas tenho a certeza de que já andaria na escola primária. Escusado será dizer que em três tempos fui descoberta, até porque estavam a faltar baldes aos senhores. Mas nessa altura também já tinha mais de metade da vinha podada e portanto… não havia muito a fazer. Mais, veio o meu avô ver em que estado tinha eu deixado a vinha e a manta** e o poio** (**“manta” e “poio” são regionalismos que designam os socalcos onde são cultivadas as bananeiras na Madeira, não confundir com alguma palavra homónima frequente no continente de significado pouco elevado nomeadamente para o segundo termo). E eu a ouvir aqueles passos pesados a aproximarem-se, eu a engolir em seco, podão na mão, eu a ver aquele homem enorme a avançar para mim com cara de poucos amigos - era assim o meu avô (mais só por fora, coração mais terno impossível!) … e eu a ganhar o respeito do meu avô! Assim. Pela transgressão que toda a ousadia contém.
“E não é que a rapariga fez um bom trabalho, muito melhor que alguns dos meus trabalhadores!” - disse a toda a gente, e toda a gente, admirada, concordou. Depois, claro, destacou-me para outra e outra latada, com os senhores. E todos os anos foi assim.
Note-se que a minha contribuição ficava-se mesmo por aí, já que, ao contrário dos meus irmãos, tudo o que tivesse a ver com pisar uvas e provar mosto não era para mim. Mas o meu avô achava que o que eu fazia, fazia-o bem e isso era o bastante. Além do que, muita gente num lagar só da confusão!
Lembro-me que no início altura não tínhamos um lagar, pelo que era necessário deslocarmo-nos a casa de um vizinho para a pisa e repisa. Mas a minha mãe, apologista da autosuficiência como eu (ou eu como ela), logo resolveu a questão ao mandar construir um lagar bem no fim do nosso quintal, antes da horta e da adega. Não é que o vizinho alguma vez se queixasse de algum transtorno, mas foi definitivamente melhor assim. A festa tornava-se completamente nossa! Nessas alturas, ficava da parte de fora a observá-los, divertidos, dentro do lagar, sujos de mosto, pegajosos do açúcar, mas incansáveis. Todos. Miúdos e graúdos.

Um dos meus grandes projectos de vida nasceu aquando deste episódio.
Um dia hei-de ter uma quinta no Douro!



domingo, setembro 17, 2006

Ódios de estimação (FRANCESES: GGRRHHH!)

Imagem.Net
Um dos meus principais ÓDIOS de estimação é aquela idiossincracia tão tipicamente francesa que faz com que de cada vez que um deles - "franciús de gema" bem entendido - fala em PORTUGAL (referindo-se a algo ou alguém) não lhes saia nada de jeito - saber de seis meses de experiencia feito ...
Desta feita, até trataram bem o português-escritor (Pudera: um Nobel, outro "étoile montante", não havia como destratar!... ), embora o mesmo não se possa dizer da portuguesa-cultura (tadinha: "indiferente e ignorante"!!!) ...
Ver melhor aqui:

sábado, setembro 16, 2006

Da interface Fonologia/Semântica*



Estava uma lula no meio da auto-estrada, quando de repente passa um pargo** a acelerar imenso. Este quando vê a lula abranda e pára.
Diz a lula assustada:
- Tás pargo ou quê?
Responde-lhe o pargo:
- Calula!


*Brincadeiras com sons
** peixe


Eheheheheh

sexta-feira, setembro 15, 2006

A anedota do dia

Dizem que, nos seus primeiros dias de vida, Adão chegou junto de Deus e perguntou:
- Senhor, o que é uma dor de cabeça?
E Ele respondeu:
- Dá-me uma costela tua e eu mostro-te!


Ehehehehehehehe....

Os meus sinceros agradecimentos ao Moisés por ter contado esta anedota à minha irmã e esta ma ter contado. It made my day!...

Desfazer a mala

Foto.net
Ir de férias é uma ideia muito feliz. Sejam férias grandes, pequenas ou assim-assim, o que importa é poder ir.
Embora a partida esteja sempre associada a alguns gestos que só repetimos nestas ocasiões, há um verdadeiramente simbólico: fazer as malas. O momento em que abrimos uma mala vazia e começamos a enchê-la de roupa, acessórios e objectos pessoais é fantástico.
Entre aquilo que sabemos que queremos levar e aquilo que apenas nos ocorre quando abrimos gavetas e armários, multiplicam-se as possibilidades de escolha. Levar mais do que precisamos é um clássico eterno. Pôr as malas no chão e sentarmo-nos vigorosamente em cima delas até conseguirmos fechá-las, apesar de estarem a abarrotar de roupa, é outro filme muito conhecido. A tentação de levar coisas a mais é universal, aliás. Não conheço ninguém imune a este vício. E, no entanto, todos reconhecemos as vantagens de um certo despojamento.
Neste sentido, a partida para férias e o gesto de fazer as malas, escolhendo o que vai e o que fica, também podem ser usados como boleia para outra viagem: a do despojamento interior. Aproveitar este tempo de descanso para olhar para nós e ver o que trazemos connosco parece oportuno e, até, razoavelmente evidente, mas a realidade prova muitas vezes o contrário. Ir ao fundo das gavetas mais fundas, escancarar todos os armários e desfazer esta espécie de mala interior, que carregamos todos os dias, pode revelar-se um exercício delicado e exaustivo, mas profundamente catártico. Isto, claro, se o conseguirmos fazer sem defesas nem poses.
O medo de desfazer e voltar a fazer a nossa mala interior tem a ver com a quantidade de coisas que temos cá dentro. São tantas, tão variadas e tão caóticas, que é difícil perceber por onde começar. Andamos quase sempre sobrecarregados de coisas (muitas delas muito contraditórias); e, por isso mesmo, é importante tomar consciência daquilo que trazemos connosco. Como? Olhando com olhos de ver, não nos julgando e assumindo que não há nenhum canto de armário ou fundo de gaveta que sejam intocáveis. Ou seja, resistindo à tentação de esconder isto ou aquilo com o argumento de que “isto não porque já é muito antigo e aquilo também não porque vem defamília”. E quem diz estes argumentos, diz outros parecidos com estes, que servem apenas para distorcer o olhar perante a nossa realidade mais íntima e profunda.
Alguém disse que toda a viagem começa em casa, no momento em que nos dispomos a partir. No momento em que fazemos as malas, talvez.
Também a viagem interior começa no momento em que abrimos a mala. Não para a fazer mas para a desfazer. Para ver o que temos guardado e o que precisamos de deitar fora.
Criar esta predisposição para o despojamento passa por querer muito arrumar a casa interior, por assim dizer, e por identificar aquilo que mais organiza ou desorganiza a nossa vida. Como só é possível ordenar a vida se ordenarmos primeiro os afectos, importa perceber que os problemas, os tesouros e as riquezas estão menos nas ideias e mais nos sentimentos. O coração é sempre mais importante que a razão, portanto.
O caos que temos cá dentro tem a ver com impulsos, desejos, inquietações, dúvidas, amores e desamores, que precisam de ser interpretados e organizados. Despojar a razão e o coração é, por tudo isto, uma atitude exigente, mas extraordinariamente regeneradora. Revela abertura de espírito e mostra que estamos sempre a tempo de renascer. De certa forma, põe-nos a “zeros” com a vida e isso é muito bom. Seja à partida ou à chegada de férias.

LAURINDA ALVES (in Correio do Vouga)

quinta-feira, setembro 14, 2006

Maus pensamentos...


Porque a insegurança ataca de mansinho e sem aviso prévio...
Será que alguém conhece boas pessoas no meio académico (em geral e muito especialmente em Portugal)?
Será que alguém conhece, boas pessoas, verdadeiramente humanas, no meio académico (em geral e muito especialmente em Portugal)?
Será que alguém conhece boas pessoas, verdadeiramente humanas, com vida própria no meio académico (em geral e muito especialmente em Portugal)?
Será que alguém conhece boas pessoas, verdadeiramente humanas, com vida própria, livres de espírito e pensamento no meio académico (em geral e muito especialmente em Portugal)?
Será que alguém conhece boas pessoas, verdadeiramente humanas, com vida própria, livres de espírito e pensamento, solidárias no meio académico (em geral e muito especialmente em Portugal)?
Será que alguém conhece boas pessoas, verdadeiramente humanas, com vida própria, livres de espírito e pensamento, solidárias e REALMENTE felizes no meio académico (em geral e muito especialmente em Portugal)?



Estamos a falar de Professores, bem entendido, que é aquilo que eu quero ser e em nome do que estou a sacrificar mais do que devia...

HELP ME!!!

quarta-feira, setembro 13, 2006

Cantar Maio é preciso ...


Canção com Lágrimas e Sol

Para Adriano Correia de Oliveira


Eu canto para ti um mês de giestas
Um mês de morte e crescimento ó meu amigo
Como um cristal partindo-se plangente
No fundo da memória perturbada

Eu canto para ti um mês onde começa a mágoa
E um coração poisado sobre a tua ausência
Eu canto um mês com lágrimas e sol o grave mês
Em que os mortos amados batem à porta do poema

Porque tu me disseste quem em dera em Lisboa
Quem me dera em Maio depois morreste
Com Lisboa tão longe ó meu irmão tão breve
Que nunca mais acenderás no meu o teu cigarro

Eu canto para ti Lisboa à tua espera
Teu nome escrito com ternura sobre as águas
E o teu retrato em cada rua onde não passas
Trazendo no sorriso a flor do mês de Maio

Porque tu me disseste quem me dera em Maio
Porque te vi morrer eu canto para ti
Lisboa e o sol Lisboa com lágrimas
Lisboa a tua espera ó meu irmão tão breve
Eu canto para ti Lisboa à tua espera...

Manuel Alegre"Praça da Canção", 1965

terça-feira, setembro 12, 2006

Confissões


O que restará de tudo isto? Rolados séculos e milénios sobre as coisas de aspecto imperecível, o que fica da vaga dos tempos e das fúrias dos ventos? Modos e modas, escolas, estilos, épocas, tudo roda e se muda. Muitas imagens e factos do passado, sabem a absurdo ou ridículo. O jovem sorri da sua imagem em criança. Todos os passados têm um sabor a afecto e repulsa, porque nenhum tempo regressa à realidade no seu tom certo. O sépia dos anos cria luzes e neblinas de tal forma que nada é repetível na sua realidade perfeita. A que vem tudo isto? A este tempo e a todos os tempos que rodam e deixam rastos, caminhos abertos de luz com o seu aspecto de evidência e obscuridade. A face real e simbólica de todas as coisas como que se revolve no nosso jogo quotidiano de referência ao todo, no espaço e temporalidade que nos cabe viver. Felizes as gerações que se revêem em espelhos e modelos, com protótipos que mereçam registo de memória e impulso para acreditar no passado e no futuro. Por isso as sendas luminosas que nos precedem de sábios, artistas, místicos e profetas, nos abrem caminhos para o que temos a criar e percorrer. Como poderia a humanidade sobreviver sem essas referências nos campo do pensamento, da ciência, do belo, e nessa arte indescritível de se relançar no imperecível, infinito e eterno que dá sentido a todo o transitório e efémero? S. Agostinho, ainda no início do cristianismo soube expressar quase todas as perguntas que há no coração do ser humano, dando consistência e sentido à edificação do tempo e do templo que constitui cada ser humano. É bom, numa época de aspecto fútil e imediatista, repousar o coração onde o convertido de Tagaste encontrou repouso: “Tarde Vos amei, ó beleza tão antiga e tão nova, tarde Vos amei! Vós estáveis dentro de mim, mas eu estava fora, e fora de mim vos procurava… Estáveis comigo e eu não estava convosco. Retinha-me longe de Vós aquilo que não existiria se não existisse em Vós… Tocastes-me e agora desejo ardentemente a vossa paz”. (Das Confissões de S. Agostinho, Lib. 7)
ANTÓNIO REGO (in Ecclesia)

domingo, setembro 10, 2006

Da admirável capacidade de fazer falar uma pedra

Há pessoas assim. Tantas, e no entanto tão poucas, com o dom da comunicação instantânea, verdadeira, interessante.
Há pessoas assim. Como eu, que me considero uma rocha geralmente intransponível em termos de sociabilidade.
Ainda não percebi como, nem sequer porquê, mas o facto é que, socialmente, não há timidez que resista a determinadas pessoas. Normalmente não são bonitas, nem feias, gordas ou magras, pretas, brancas, azuis ou amarelas, são pessoas, apenas. Mas com elas algo de mágico acontece: os assuntos fluem, as barreiras anulam-se, as horas, os minutos e os segundos passam e tudo é agradável, faz bem, faz sentido.
Comigo, que me considero tímida e me furto vezes sem conta ao social – ao contrário do que apregoa (quase) toda a gente que me conhece, isto acontece muitas vezes. Muitas. Mesmo. E se em algumas situações isso já me trouxe alguns dissabores (Porque é que quando se fala três horas seguidas com uma pessoa do sexo oposto, manda a sociedade – o ou a mente do interlocutor, nomeadamente se for do sexo masculino, – que haja obrigatoriamente um interesse emocional por detrás da curiosidade que alimenta a conversa? Comigo pelo menos é o contrário: quanto mais interesse, menos assunto/conversa!). Na maior parte das vezes fazem-se amizades, ou pelo menos conhecimentos que, além de humanamente enriquecedores, costumam perdurar algum tempo, se não vida fora.
Considero que, actualmente (e sinto isso muitíssimo em Portugal!), conversar está fora de moda. Não há tempo. Nem vontade, nem interesse, nem paciência. Para acolhermos o outro no nosso cantinho, para lhe perguntarmos acerca do seu mundo, para fazermos pontes de conhecimentos no dia-a-dia. No dia-a-dia. No quotidiano. Durante o dia. Ao longo do dia. Sem deixarmos de fazer o nosso trabalho com eficiência e profissionalismo e cumprirmos as nossas obrigações com o brio que todos devemos cultivar. Obviamente. Tenho muito enraízada a ideia de que, nomeadamente em Portugal, alguém só fica na disposição para conversar com outra pessoa, devidamente seleccionada de acordo com padrões estéticos mais ou menos estandardizados, à sexta-feira à noite… E convenhamos, seja porque se passou a semana toda enclausurado a trabalhar, seja porque não se tem mesmo interesse em conhecer ninguém profundamente, essas conversas, na maior parte das vezes, deixam muito a desejar …
Parece que ninguém quer sair da bolha que criou, até porque isso além de incómodo, seria uma ousadia, olhada de soslaio por alguns, reprovada por muitos, e (claro!) para ousar temos de ser, nem que seja um bocadinho, loucos. (Ninguém quer ser tido como louco nos dias que correm, por isso é que ninguém anda descalço ou à chuva, ninguém sobe às árvores, dá uns quantos berros quando lhe apetece ou faz o pino!) Isso significaria revelar-se ao outro e deixar a nu todo um leque de falhas, defeitos e inseguranças que aparentemente não temos se não as mostrarmos.
Pergunto-me muitas vezes acerca do futuro de uma sociedade assim, um futuro que, para o bem e para o mal, é nosso. E os augúrios não são muito auspiciosos.
Nos EUA, há uma obsessão que domina as pessoas: toda a gente quer ser rica. E então, trabalha-se muitíssimo. (Quem me dera que se passasse o mesmo em Portugal!) Não obstante, as pessoas já se aperceberam que precisam do convívio e então, pelo menos no contexto da Academia, por da cá aquela palha temos pique-niques e churrascos e festas e … E as pessoas conversam. Mesmo. É possível que seja cultural também. Efectivamente, não há americano que resista a estar ao lado de quem quer que seja, onde quer que seja, sem fazer small-talk. Começa pelo tempo, depois passa para os estudos, depois para o local de origem, desporto, viagens, política, livros, filmes, religião… é uma torrente!
No início estranhei, confesso. Mas agora dou por mim a fazer small-talk onde quer que seja também e a desejar que chegue o churrasco deste mês (é sexta!) para falar com aquela pessoa que encontrei no outro dia, que era conterrânea do Gabriel García-Marquez e tinha imensa coisa para contar acerca do quotidiano dos rebeldes na Colômbia.
Também não me posso esquecer dos meus colegas de casa (qual é a designação correcta para uma pessoa que partilha a casa connosco?), um em especial, que espera por mim, às vezes até às onze, in his words “só para me dar as boas noites”, sabendo perfeitamente que havemos de ficar a conversar até muito para lá da meia-noite sobre a Universidade, o dia, estes dias, nós, os outros, opções, trabalhos e sonhos.
Se calhar, ainda há esperança…
Obrigada M.!


"Autopsicografia"

Ana.Marta

quinta-feira, setembro 07, 2006

Sentimentos do fundo da mala (II)

Da Escolha
“Não gosto de escolher, perde-se sempre alguma coisa com a escolha.” – ouvi há dias. Nunca tinha pensado assim. Mas agora, vendo a coisa por esse prisma, choca-me a profundidade do desabafo.
Fazemos tantas escolhas todos os dias, umas grandes outras mais pequenas, todas significativas… e perdemos sempre algo, muito, pouco, não sei, nunca pensei, mas privamo-nos voluntariamente, consciente ou inconscientemente, em nome de um mal, que cremos, menor. Não há volta a dar-lhe, o facto é mesmo esse: perdemos.
Dizem-me desde sempre que sou incrivelmente inflexível, e essa será porventura a razão por que nunca, até presente, me tinha apercebido da inevitabilidade da perda inerente à escolha. Essa será porventura também a razão por que não mudo. Cheguei há precisamente duas semanas e claro que ainda não tive a oportunidade de estar com todas as pessoas que queria, mas uma coisa é unânime entre os meus amigos, saindo-lhes mesmo antes do “Olá!”, como se a estupefacção atropelasse a polidez na ponta da língua: “Estás igualzinha, incrível, não mudaste nada!” E então replico, mutatis mutandis, os argumentos que já tinha esgrimido quando regressei de Paris: “Estavam à espera de quê? Até parece que não me conhecem? Não achavam que vinha de texanas, chapéu, estrelinha e colete?” E abraçamo-nos, rimos e passamos logo à fase seguinte, a actualização das últimas “do país e do mundo”, vulgo intensivas sessões de cusquice e porventura até de alguma maledicência. Essa será possivelmente também a razão por que tenho dois (melhores) Amigos e uma lista infindável de colegas e conhecidos que a convenção oral, as máximas conversacionais e a implicatura discursiva tornaram “amigos”. Essa será porventura a razão por que a generalidade das pessoas ou me adora, ou me detesta. Essa será porventura a razão por que sou de extremos em quase tudo.

Inflexibilidade? Inflexibilidade.
(O que os meus amigos não sabem é a quantidade de situações (leia-se "apuros") de que o cultivo da dita - Inflexibilidade -, felizmente, já me retirou e nem sequer calculam o quanto me custa ser inflexível, tantas vezes, em certas e determinadas situações, quando é muito mais cómodo e até porventura benéfico para mim no imediato não o ser.)
Há quem lhe chame Coerência, Princípios, Constância, Valores, Personalidade, até Medo!... Os meus amigos ficam-se pela Inflexibilidade. Dizem que me assenta bem. (!?)
No entanto, dadas as circunstâncias, e apesar da Inflexibilidade que, admito, me caracterizará, considero absolutamente impossível ter escapado a alguma mudança, o que quer dizer que, à excepção de um, até agora, os meus amigos são muito pouco observadores. As maiores e mais importantes mudanças não se vêem a olho nu, operam-se no interior de nós mesmos.
Eu própria não sei ainda bem o quê, mas alguma coisa mudou… e bastante.
O "amigo observador" acha que nos meus olhos há um brilho diferente...
Porto, 8 de Junho de 2006

quarta-feira, setembro 06, 2006

Drowsiness

Ofelia.Dali

Ele e Ela


- Então e há quanto tempo és vegetariana? – atira Ele.
Ela não sabe se o que Ele diz, diz sorrindo, se sorri dizendo... Mas diz muito e sorri ainda mais. Ela de saber o muito, já não sabe nada. E não sabendo nada, sabe que o muito é demasiado, tanto de não o ser.
- …
Ela tenta ganhar tempo.
As compatibilidades, os gostos e os interesses sucedem-se a uma velocidade vertiginosa, a cumplicidade cresce exactamente ao mesmo tempo e na mesma proporção que os sorrisos, os olhares e até a conversa… que definitivamente está a ficar por demais perigosa. Para Ele. Para Ela. Para todos.
Daí que, num gesto universalmente infantil, desajeitado e por isso quase terno, Ela indicou “Quatro!” Gestualmente. Não porque estivesse de boca cheia – apesar de o estar – mas porque era imperativo furtar-se à comunicação. Por Ele. Por Ela. Por todos.
Já lhe bastara o embaraço de ter passado o serão todo a arrumar livros com Ele, sob a supervisão da namorada, de lhe saber a vida toda, sob a supervisão da namorada, o serão todo a tentar responder ao que Ele perguntava da forma mais sobranceira possível, sob a supervisão da namorada, o serão todo a tentar conter-se perante as piadas, os risos e as gargalhadas que Ele soltava de cada vez que um deles dizia “Really, me too!”, sob a supervisão da namorada, o serão todo a tentar fugir-lhe do caminho e do toque, sob a supervisão da namorada, o serão todo a dizer de si para si que as coincidências entre os dois não são milagres, apenas partidas que o destino prega para testar os incautos.
Doi-lhe a cabeça, os olhos e os maxilares de tanto cerrar os dentes. Fervem-lhe as maçãs do rosto de tanto o tentar tornar sério… Há umas boas sete horas que se encontra nesse limbo e teme que o momento em que vai inevitavelmente soçobrar ao cansaço esteja próximo, até porque a luta consigo própria tinha sido árdua e não cessara nem por um momento. Ela reza para o tempo passar rápido e o regresso a casa estar por minutos… Até lá, para se enganar a si e ao tempo, e para evitar maiores embaraços, o melhor que consegue é ir ocasionalmente desviando o olhar sob um falso pretexto de um interesse absolutamente científico na observação do ambiente envolvente, até então invariavelmente irresistível para Ela, e, observando, dissecar a atmosfera do Ihop às duas da manhã.
Na verdade, estava perante um ambiente humano absolutamente inesperado, surpreendente até! A um canto, três casais árabes, jovens, faziam-se notar porque discutiam, em tom mais elevado que o normal, se uma das raparigas do grupo estaria ou não drogada; à direita, três pré-adolescentes afro-americanos jantavam calmamente; Ela percebeu de imediato que nessa mesa a média de idade não rondaria mais que os catorze anos e essa constatação sobressaltou-a um pouco; olhou mais em frente, na direcção do único casal americano que estava na sala, e novo baque, mas curiosamente pelas razões opostas, deveriam ter sessenta e muitos anos…
Ela volta-se para o seu prato, vegetariano como o d' Ele, para a comida que Ele está a acabar e que Ela não consegue engolir. Olha em frente, para a namorada, que lhe parece, lhe pareceu o serão todo, pela primeira vez desde que a conhece, insegura. A namorada que considera genial, encantadora, simples e única, a namorada que é uma das pessoas mais interessantes que Ela conhece, que tem habitualmente uma alegria contagiante e sempre um coração do tamanho do mundo, tão grande e tão bom que abrange tudo… A namorada que hoje está diferente.
- Mas comes peixe, certo? – perguntou-lhe o T.
Finalmente alguém que não o dito lhe fazia uma pergunta. Agradeceu a Deus e ao mundo aquela brecha em que pode finalmente desviar o olhar d’Ele sem ter que passar os olhos pela sala, pela enésima vez.
- Nop. No fish at all, for a long time now.
- Eu também não. – disse Ele franzindo o sobrolho num trejeito divertido.
- Ai não? – inquiriu, impondo-se, a namorada.
- Ok, às vezes… - anuiu embraçado, mas logo se volta para Ela e conclui:
- Portanto, és uma vegetariana inclinada para o vegan. – disse Ele com um olhar interessado e exigente, aquele olhar típico de quem está à espera da explicação detalhada das razões da opção.
- Sim. – disse Ela ao mesmo tempo que tenta, em vão, acompanhar a resposta lacónica com um sorriso que pretendia compensatoriamente sincero. (...)
Ela voltou à comida, pensando para consigo: Se não tivesses namorada e eu não tivesse escrúpulos…

segunda-feira, setembro 04, 2006

Anecdotic!


What Your Bathroom Habits Say About You


"You are a giving soul. Way too giving in fact. You often get stuck doing the dirty work that no one else will do.

You spend a lot on clothes, and you tend to be a very dresser. However, it's hard for you to throw away trendy clothes when they go out of style.

You are a little shy and easily embarrassed. You often wonder if you are normal.

In relationships, you tend to take care of your needs first. You can only be with someone who's as independent as you are."

domingo, setembro 03, 2006

O derby cá do sítio








Rice University vs. University of Houston.
Foi ontem. Francamente ainda não percebi a piada. Mas enfim... os americanos divertem-se. E eu também... a observar!

sexta-feira, setembro 01, 2006

De dar a volta à cabeça

ter.*
ter.* de [vr*]
ter.* que [vr*]
ter.* que [vk*]
ter.* [vk*]
haver.* que [vr*]

e muito, muito especialmente

haver.*
haver.* [vk*]
haver.* que [vk*]
haver.* de [vr*]

Alguém me ajuda?

Pérolas...

MAN= 'featherless biped'

Aristotle, Organon