Lá em casa toda a gente me goza porque é frequente chegar e dizer "Sabes quem vi hoje? O... A... ". Costumam dizer que só posso estar a brincar, porque não é possível, e nunca encontram ninguém, e não conhecem quem encontre tantos famosos quanto eu... Desconfio que a maior parte das vezes pensem que invento ou que apenas vi alguém parecido e precipitei-me logo a pensar que era "O" ou "A". Eu acho que não. Não me precipito, nem invento, nem vejo mais pessoas famosas do que o cidadão comum que anda pela sua cidade com olhos de ver. O que acontece é que eu perco tempo, literalmente perco, a ler revistas cor de rosa, coisa que na minha casa não se faz, ever, ever, ever.
Temos um shopping relativamente perto de casa, frente ao estádio, e, paradoxalmente, nem vamos lá muitas vezes, não é o maior, nem sequer o mais bonito, é apenas aquele que fica ali, pertinho. Passamos por lá de quando em vez, quando o estudo já pesa demasiado nas costas ou arde nos olhos, quando rir e ver gente e ouvir gente faz falta. Indo-se ao cinema ou não, acaba-se invariavelmente por jantar lá - até porque shopping com hamburguer vegetariano é raro por estes lados!
Ontem voltei a vê-lo. Pela terceira vez. E como não penso antes de sorrir, sorri-lhe, como sorriria para toda e qualquer pessoa cujo olhar encontrasse pela terceira vez no mesmo recinto, independentemente de nos conhecermos, independentemente do sexo, da idade, da ocupação e da condição social. Sorri-lhe, mas não devia. Devia ter-me lembrado do olhar baixo, embaraçado, que se seguiu ao meu sorriso, o mesmo olhar pela terceira vez. Não me lembrei, peço desculpa. Pedi, interiormente.
Este "O" é um atleta sul-americano, novinho, que o FCP comprou o ano passado, que joga na equipa principal e é famoso (bem, falou aos media uma ou duas vezes), mas não parece ligar muito a isso. Veste-se e comporta-se normalmente (não fosse a bebida energética que acompanhou o jantar), a mulher também - coisa rara no futebol em Portugal - vêm sempre, no dia de folga julgo, com um outro casal, que eu desconheço, da mesma nacionalidade e da mesma faixa etária e da mesma discrição, e juntos jantam e falam, falam baixo e não riem alto, e vão à sessão cinema que acaba à meia noite. E saem do cinema e desaparecem. Tem sido sempre assim.
É o famoso mais normal que conheço. Da primeira vez, lembro-me que não fui a única a reconhecê-lo, dois adolescentes também se fartaram de olhar e comentaram algo sobre o seu desempenho no dia anterior, ouvi claramente o nome dele, e sorri em conformidade para os meus irmãos, descrentes. Nas vezes seguintes foi diferente, apenas eu o reconheci, mas o embaraço dele foi o mesmo.
Gosto deste famoso. Gosto de muitos famosos por muitas razões, desgosto outros tantos por outros tantos motivos, mas gosto particularmente deste famoso. Porque foge ao sorriso, mas sobretudo à regra. Porque tem pudor, e essa postura, humilde, espelha uma perfeita noção da realidade, fora de moda, fora do comum. Porque secretamente admiro quem tem medo, quem tem medo, tem esperança.
1 comentário:
Olá Joaninha
É um famoso em que a fama não afecta o seu comportamento em sociedade.
Despida de vaidade e vedetismo, uma pessoa assim é forçosamente sã.
Beijinho
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