sexta-feira, agosto 17, 2007

Voltar atrás

Lembro-me como se tivesse sido hoje, embora não saiba ao certo quando foi, este ano, o ano passado, se calhar há mais tempo.
Regressava de Braga a São Bento, já tarde; por acaso ou concertação prévia, a minha irmã mais nova apanhou-me bem à saída da estação e decidimos ir para casa a pé, contrariando o hábito imposto pela facilidade dos transportes públicos. (Ainda não havia metro, portanto foi há mais tempo do que pensava inicialmente.) Subíamos a rua, cujo nome não me recordo agora, uma que sobe de São Bento até à de Santa Catarina, e assistimos a uma cena comum: um arrufo de namorados - adolescentes apenas na gestão das emoções. Mais adolescente ela que ele, como quase sempre.
"Se quiseres vai, então vai. Mas não voltes, não olhes para trás sequer!" - ouvimo-la claramente assim que passávamos por ambos. E o rapaz foi. Silente. E não voltou. E não olhou para trás. Nunca.
E nós ficámos estupefactas. Inexplicavelmente, ou talvez não, admirámos o rapaz. Mas isto apenas até ao momento em que ela foi ter com ele e estavam a tentar resolver a situação. Aí feneceu o espanto, interiormente sei que a odiei um pouco - o tão feminino retorno, tão típico! -, não sei que terá sentido a minha irmã. Mas tenho por certo que o episódio a marcou. Ainda hoje se fala do dito de quando em vez.
Se há coisa que não consigo fazer é voltar atrás. E sou mulher. Ainda hoje comentava isso com uma amiga. Chamem-me o que quiserem, sou básica, obstusa, rotunda, nas relações. Acho que é o que se deve ser. Nas relações. Básico. Se magoa, não é o que queremos para nós. Se sabe bem, é. Básica. Pois sou.
Nestes dias em que estive na Madeira não saí, tinha mais que fazer, e a verdade é que os amigos que guardo no coração que se encontram na ilha contam-se pelos dedos de uma mão e têm uma série de responsabilidades profissionais que fazem com que o verão não seja a melhor altura para estar com eles.
Nestes dias em que estive na Madeira recebi uma sms de uma antiga amiga dos tempos de Faculdade, a Isabel, a contextualizar-se perfeitamente porque "há muito tempo que não falamos", palavras dela, e a informar-me que se encontrava na "minha ilha", palavras dela, "a passar a lua-de-mel", palavras dela também.
A Isabel foi a única pessoa até hoje que considerei a minha melhor amiga, embora a um nível diferente da minha mãe, claro! Já devo ter falado dela por aqui. Davamo-nos muito bem, ela tinha muita paciência para mim e para o meu mau feitio; fazíamos imensos planos de futuro, íamos morar perto uma da outra, ia ser madrinha dos filhos dela e ela dos meus; a vida ia passar num sopro, mas a nossa amizade não, permaneceria. Afinal foi num sopro que a amizade passou, por uma razão que eu considero basilar numa amizade, e o que ficou, uma sms em meia dúzia de anos, não chega sequer para fazer permanecer o que quer que seja. Obtusa. Sim.
Não consigo voltar atrás. Não consigo. Ou melhor, consigo, estou a conseguir, aqui e agora. Pela memória. Só volto atrás pela memória. Mas Hoje. Só. Ocasionalmente. Apenas. É disso que vive a memória, suponho. Do voltar atrás. Do retorno. Como a menina de Santa Catarina, que eu não sou em definitivo.
A minha irmã do meio está neste momento num casamento. No casamento da sua madrinha de curso, por acaso nossa conterrânea, por acaso agora mulher do único primo da Isabel. A vida é engraçada. Mas, como eu, sorriso rasgado ou lágrima no olho, garganta seca ou coração a palpitar em todo o lado, não volta atrás.

5 comentários:

Doppelganger. disse...

Voltar atrás pode ser bom, mas isso só tu sabes...

bjnh

rui disse...

Olá Joaninha

Pois é. Há coisas que nos magoam imenso.
Coisas e atitudes que não esperavamos daquela pessoa em quem confiavamos e que nos magoou.
Essa decepção, leva-nos a tomar decisões, por vezes tão radicais, mas nem sempre defínitivas.

Fica bem
Beijinho

100 remos disse...

As portas que vamos deixando abertas e que teimamos em não fechar deixam que a corrente do tempo nos esfrie e nos seque...Bj

Anónimo disse...

Voltar atrás e não voltar atrás... ambas são certas, em algum momento...

Beijo, menina!

Oásis disse...

É bom ser básico nas relações (embora eu seja confusa :P).
O único ponto em comum nessas características é que não é fácil ser simples (adequa-se mais que "básica") nem ter muitas dúvidas (adequa-se mais que "confusa").
Beijinhos