Eram quatro da tarde e tinha-se esquecido de fazer a cama. Aquela coisa básica que se fartava de nos obrigar a não esquecer nunca a cada verão e a sermos rápidos a por em prática de manhã, logo após o banho“... que se abrirem a cama ao levantar, tem tempo suficiente para arejar...” – tinha-se apagado da sua memória, das prioridades do dia, pelo menos.
Ao resto já me habituei, ao resto, à sequência das mesmas perguntas sobre os assuntos de sempre: eu, a minha mãe, os meus irmãos, o meu pai, o meu tio, o sobrinho-neto, ao resto, ao ter de responder eu sempre de maneira diferente para não ficar triste ao perceber que acabou de me fazer a mesmíssima pergunta, ao resto, às advertências sempre sentidas, importantes, sinceras, mas despropositadas, acerca do nosso clã, ao resto, aos reparos sucessivos sobre um qualquer pormenor da minha roupa ou do cabelo, ao resto, ao atafulhar-me a pasta, a mala, os bolsos, de coisas absolutamente sem valor, estranhas e supérfluas, a isso tudo já me habituei, obrigou-me de certo modo a isso, também. Ao ter-se esquecido de fazer a cama, não. Ainda não.
Todos os dias morremos um pouco, morrem-nos não sei quantas células, mas há dias em que, morrendo-nos o mesmo número de células do dia anterior, morremos mais. Dias bonitos, como ontem, como hoje, dias de sol, dias frios, dias claros, dias de Inverno; dias tornados noite, dentro, onde não chega o frio, nem o sol descobre uma certeza pequenina, a de que vamos ser eternos na memória dos que amamos.
11 comentários:
Joaninha: quanto carinho!...E tão triste,para os meus fantasmas!
A última frase diz tudo.
Maria de Lourdes,
O carinho tem um condão especial: o de afastar fantasmas.:)
Musicólogo,
Sou perita em últimas frases. E tu devias ser professor de Escrita Criativa (o meu está-me sempre a dizer o mesmo que tu ;))
Jinhos a ambos.
Olá...lindo o teu texto. Vê o video lá no cem ( o do CSI )...kep the faith.Bjos
"vamos ser eternos na memória dos que amamos"... E é esse amor que te faz doer o coração quando a vês agora mas também que faz com que persistas em vê-la e em não esquecer que ela precisa desse amor, mais do que nunca.
texto tristinho este! mas bonito nas palavras.
Olá Joaninha
De certeza que sim. Nunca esqueceremos aqueles que amamos.
Lindo texto.
Beijinhos
O amor...
Paulo,
A memória... e... A vida...
;) Jinhos.
Um texto tão bonito e cheio de reflexão existencial POr morrermos um pouco todos os dias é que devemos viver a vida o máximo que conseguirmos.
adorei*
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