Quando éramos pequenos, muito pequenos, ao almoço ou ao jantar, já não sei, mas aos fins-de-semana porque tínhamos a disponibilidade jovial da nossa mãe, a nossa mãe toda para nós, esgotadas as histórias de sempre e as lengas-lengas do costume e as adivinhas mais que conhecidas e tudo o mais que era hábito lhe pedirmos, a minha mãe cantava:
Minha Terra é a Madeira / Embalada ao som do mar / Tem prados cheios de relva / e as Ribeiras a cantar // Ela toda é um jardim / de cravos e brancas rosas / por onde vou e torno a ir / estudantes mariposas // Minha Terra é a Madeira / Embalada ao som do mar / Tem prados cheios de relva / e as Ribeiras a cantar...
Confesso que não é das Quadras Populares que mais me agradam, mas, como quase sempre, é das que mais fica no ouvido. 'Minha Terra é a Madeira' não é apenas título de canção popular. Não se escolhe o nome. Não se escolhe a religião. Não se escolhe a ascendência. Não se escolhe onde se nasce.
Acabamos por nos chamarmos aquilo que os nossos pais decidem; frequentamos a Igreja e a catequese se eles assim decidirem; pertencendo-lhes ou não, somos deles, da carne deles, do sangue deles, da terra deles, pelo mais assombroso e admirável milagre de todos.
Quando os ingleses dizem que casa é onde está o coração estão a apontar com o indicador esta condição abandonada de nós mesmos, isto de sermos o que somos, isto que é anterior e, sobretudo, independente de nós.
A Madeira são os meus pais. A Madeira é a minha infância de mimo e a minha adolescência de brilho. Mas a Madeira sou eu também, não se escolhe onde se nasce. Mesmo se depois escolhemos percursos e amigos, profissões e casas. Mesmo se o meu presente é longe e não equaciono o meu futuro lá, a Madeira sou eu. Fatalmente, irremediavelmente. Verdade.
Quando vou para fora e me perguntam de onde és, digo venho do Porto, trabalho em Braga e sou da Madeira. Ainda não estive em nenhum sítio do globo onde não fosse comunicativamente mais fácil ser da Madeira que de Portugal. Às vezes penso muito nisso, na Madeira e na marca Portugal no mundo.
Uma calamidade assolou a Madeira este fim-de-semana. Não pararam as mensagens nos vários e-mails e telemóveis cá de casa. Comovemo-nos. Antes de sermos os lugares por que passamos e até aquele que escolhemos para nós, somos o lugar onde nascemos e deixámos coração.
6 comentários:
Verdade para qualquer pessoa. Nao tanto para mim... sou um ser arrizo.
Beijicos
E nada é melhor escrito quando é tão sentido.
Espero que esteja tudo bem, Joaninha!
Um beijinho*
Estive fora e chegou sou um zumzum. Hoje deparei-me com aquilo. Ainda bem que por este blog, à parte do coração apertadinho e triste, está tudo bem.
Beijinhos
Rosário, Frida, Ouriço,
Tudo muito bem com os meus, felizmente.
Tudo menos bem por lá, por lá também. Vai levar algum tempo para que se volte à normalidade, mas já se trabalha nesse sentido. :)))))))
Jinhos a todas, um abracinho agradecido pela simpatia.
Eu sei que a Madeira não tem comboio mas os tempos foram mesmo turbulentos! um beijinho grande para ti, cidadã do mundo mas com a Madeira na raiz
;)
Outro, para ti. :)))
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