Não gosto de talheres, pratos e copos de plástico. Não gosto de esferográficas que não sejam bic ou molin. E não gosto de fita-cola.
Não gosto. Se puder, como outra coisa, mais rápida e menos saudável até. Se puder, escrevo a lápis, ou com a caneta bic ou molin – vermelha, verde, preta, que tiver. Se puder, meto a prenda num envelope de papel ou num saco de tecido, esqueço o papel de embrulho.
Tenho muito a impressão de que a minha geração é a dos plásticos de comer e para comer, a da primeira coisa que se apanhar para um rabisco mais importante na palma da mão e muito, muito, muito, a da fita-cola. Para tudo. É certo que não é coisa bonita, mas, transparente, quase nem se dá por ela e faz bem a sua função: cola. Cola até daqui a nada, até à noite, até amanhã, até depois, até o dia em que em que se rasga o papel na busca do conteúdo.
Este fim-de-semana, ao falar ao telemóvel com uma amiga, não passou despercebido a outra, durante a minha breve chamada, o meu tom de voz algo alterado, melífluo. Disse-me. E eu não tive muitas palavras. Pois. Sim. De facto.
Disseram-me um dia que há palavras que juntamos apenas para algumas pessoas. Por acaso junto muitas palavras, porventura iguais, para mais, muito mais, do que algumas pessoas, felizmente. Mas digo-as de maneira diferente, muito diferente, espero, conforme a pessoa a quem me dirijo, especificamente. Era esse o caso.
Há pouco mais de meia hora, na minha hora indecente de almoço, passei pelo centro de Braga e detive-me numa montra de uma loja por que já não passava há muito tempo. Ainda lá estava algo que cobiçava desde essa altura. Sem pensar muito entrei, dei as boas tardes e logo veio um senhor – que me pareceu ser o dono, marido da senhora que estava no outro balcão – que se encaminha para mim, muito profissional. Perguntei o preço, inusitadamente barato, pedi para ver, sorri, disse que ia levar. Muito bem, respondeu-me o senhor, muito profissional, novamente. Abre uma gaveta tira uma caixa, abre outra tira algodão, coloca-o sobre o algodão, fecha a caixa. Distraio-me. Abre o armário, tira papel de embrulho, não é preciso, é para mim, inclinei-me para dizer, não disse. Não quis desconcentrar o senhor que media e dobrava e cortava o papel para embrulhar. Sem pressas. Olho para os lados à procura do fim do processo, da fita-cola. Não há. Abre outro armário, um carro de fita. Eu a olhar para o senhor e para a fita, eu a prever o que se ia seguir e a tentar reter dentro a emoção. Meio metro de fita enfeita, encima e segura a prenda que me ofereci a mim própria esta tarde. Meio metro de fita que não prende, nem cola, nem rasga, segura. Meio metro de fita relembrar-me-á sempre que as pessoas de há duas ou três gerações têm maneiras extraordinariamente bonitas, singulares, de nos darem um bocadinho delas. Seja na nossa fotografia de há quase um ano que nos colocam à cabeceira, seja a embrulhar uma prenda com fita, seja a pensar num sítio que seja mais do nosso agrado e encaminhar toda a gente para lá, seja a dizer então, muito obrigado, Menina. E é por isso que o tom de voz muda.
5 comentários:
Já te disse que também por isso que adoro Braga? Também é por isso que adoro Braga. Por aqui raramente encontramos também essa maneira de dar. Talvez também porque não haja muita gente que queira receber...
Ouriça,
Curioso... Com a excepção do episódio da fita, todas as maneiras de dar enunciadas são "lisbonenses".
As boas pessoas, como as más, estão em todo o lado. São é mais discretas... ;)
Jinhos.
Esses embrulhos antigos que deviam ser para sempre. Há lojas dessas também no Porto, onde os senhores atrás do balcão usam o tempo para embrulhar as nossas coisas em papel castanho atado com fita... Gosto!
Braga, Braga, :)
GNR+GNR hoje na RTP1 à noite 23:45!
Beijinho
Pedro,
Braga :))))))) Mesmo. ;)
GNR+GNR got it. ;) Não me escapa, logo.
Jinhos.
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