terça-feira, setembro 09, 2008

O triângulo


Os ingleses não conhecem a expressão “triângulo amoroso”, que eu pessoalmente nunca percebi muito bem, também, por associar desde sempre o triângulo à perfeição, à completude. Em Inglês então, a expressão equivalente é: the square in our triangle, o que me parece a todos os níveis mais adequado, faz muito mais sentido, pelo menos.

O Jorge Luis Borges diz que quatro coisas apenas merecem ser tornadas livro, a saber: “... uma luta pelo poder, uma viagem, uma história de amor entre duas pessoas, uma história de amor entre três pessoas...”

Cá para mim, que não vou escrever nenhum livro – hoje, pelo menos – não consigo deixar de ver as vírgulas entre as quatro transformarem-se em sinais de igualdade, precisamente quando a ordem das quatro se baralha e as torna um todo indivisível, uma só, uma única, a mesma, coisa. Mas isso, isso deve ser de não conseguir deixar de as olhar. Ou da minha cabeça.

Todos os dias no comboio, quando me sento e olho para a frente, sinto um calafrio moer-me dentro. Há um senhor de meia idade, que, depois de colocar a sua pasta nos assentos ao lado esquerdo do seu, cumprimenta com um aceno de cabeça uma senhora de meia idade que se costuma sentar atrás dele. Muito arranjada, muito bonita, muito doce, ela tem os olhos maiores, mais escuros e mais tristes que eu já vi. E quando a outra entra, é vê-los, como eu pelo reflexo do vidro, mergulharem, perdidos, naquela tristeza profunda que vem não sei de onde e tudo mina, sempre. Eu a vê-la chegar, todos os dias e a fazer figas, todos os dias, para que hoje seja o dia em que a senhora dos olhos grandes não suspire, não se encolha, não se importe. Perceba o filme tremendo que está a fazer, só ela, dentro da sua cabeça às madeixas loiras. E eu a olhar para a outra e a pensar como é que o senhor de meia idade não vê que a senhora de meia idade, e onde tem a cabeça para se desdobrar em sorrisos e gentilezas e salamaleques para a outra que está longe de perceber que ele, e é tão hirta, tão seca, tão austera... de tão jovem.

E foi assim que me pus a pensar em como a juventude pode ser o lago negro em que os olhos da senhora de meia idade se afundam todos os dias. E foi assim que me pus a pensar que a sensaborona do comboio sou eu também, aos olhos, ácidos, de uma outra senhora, que já deixei de pretender conquistar há muito.

Mas isso é quadrado para uma outra história.

6 comentários:

Oásis disse...

É impressão minha ou aí as pessoas sentam-se sempre nos mesmos lugares no comboio? ehehehe

Agora, no comboio, ando outra vez a escrever no moleskine e não oiço nem vejo nada à minha volta, poderiam ser sempre as mesmas pessoas a senterem-se perto de mim _ e muito provavelmente são_ que eu não dava conta.

Doppelganger. disse...

Eu nnc fui muito de me sentar sempre no mesmo sitio no comboio, mas reparava sempre nas mesmas pessoas, nos mesmos grupos, e q ficava a apontar tudo o que els diziam, e o q eu pensava sobre isso.

Beijinho*

Doppelganger. disse...

ainda n percebi mnh amiga, o q fazes na UM, explica-me sim?
Eu disse a mnh namorada hoje, q fazes alguma coisa, mas n sei o q... :S dsclp..

Beijinho*

Joana disse...

Orquídea,

Sim, sentam, sempre. Pelos menos no meu comboio da manhã...

Pedro,

Eu também aponto... mentalmente! :P

Nada a desculpar! :)))))))

Jinhos.

ana salomé disse...

lindo, lindo, joana. *

Joana disse...

Ana Salomé,

Linda és tu.

E *desconcertante* de tão linda, sempre!

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