segunda-feira, maio 12, 2008

Dos regressos.

Andei por cá, mas sem escrever. Precisava de pensar na semana que passou. Uma semana a todos os níveis estranha, a vida é tão estranha!... E tão simples e clara ao mesmo tempo, também. Há dias que ando para dar um passo daqueles importantes, capazes de mudar a vida a uma pessoa e, sem saber bem porquê, ou sabendo muito bem, mas não querendo dar-lhe a importância, o peso e o valor da origem e da causalidade, esforçava-me continuamente por permanecer, por não ver, por adiar essa mudança. Não mais, agora.
A semana passada foi a semana dos regressos. Da admirável inefabilidade do regresso. Este post podia chamar-se assim.
Deixei de gostar da palavra regresso quando comecei a estudar em Literatura Grega a Odisseia. O professor entusiasmava-se ao falar da raiz que em Grego regresso (nosós) e doença (noséos) têm em comum e eu não compreendia. Doença, regresso; regresso, doença. Nunca regressamos de sítio nenhum para sítio nenhum iguais, mas doentes? Doentes do regresso? Doentes pelo regresso? Regressar, adoecer. Não percebia. Não percebia, até ter ido para Santiago de Compostela certa vez com um rapaz, espanhol, que, do outro lado da coxia, viagem toda, chorava. Alto. Alto. Alto. Não percebia, até ter feito o mesmo nas mais de dez horas de uma madrugada que não acabava nunca, num autocarro de Faro ao Porto, Agosto passado.
A semana passada foi a semana dos regressos, do eu à porta que deixei aberta, todo o tempo, para ti, e das janelas que fechei, todos os dias, por ti.
A semana passada foi a semana dos regressos, daquilo que me enche verdadeiramente o coração e que eu julgava perdido, coração esquecido, amarrotado, no fundo de um caixote de papéis de um país vizinho, mas distante.
A semana passada foi a semana dos regressos, do tu que nunca deixarás de ser, da tua camisola de lã inglesa, azul aos losangos, do tu que nunca chegaste a ser, do que tu nunca consegues ser, de todos os tus que foste.
A semana passada foi a semana dos regressos, do que eu nunca fui, do meu xaile vestido e do meu xaile dobrado, nas costas da cadeira, do eu que não sou, do eu que não deixarei de ser.
A semana passada foi a semana dos regressos, do sentido que finalmente tudo tem porque todo o sentido se perdeu.
A semana passada foi a semana dos regressos, de um eu, melhor que eu: portas e janelas abertas, cabelo ao o vento, mão em concha, a amparar o sol que veste de luz e vida o interior da casa.

5 comentários:

Maria de Lourdes Beja disse...

DESCONCERTANTE,é o que é!!!
Regressar,depois de uma porta que nunca se fechou,pressupõe sempre uma "carrada" de promessas,de alvoradas...Se houve "o que eu nunca fui", ao regressar,passou a "ser",ou estarei enganada?
Bjs.

Joana disse...

Desconcertante? Não. Pelo contrário! :)

O regresso *dos outros*, todos e de uma só vez, fez com que me tivesse apercebido de que o que nunca fui, nunca fui porque não valia a pena que fosse, e portanto não há ressentimentos.

Por outro lado, até estou mais feliz, *regressei* à felicidade de antigamente, quando não me esforçava por (encontrar motivos para) sorrir. :P

Jinhos.

P.S. É sempre a primeira a comentar os meus posts mais íntimos, tem cá uma intuição...

Marta disse...

O clip de audio, que está no teu perfil, adorei... Só no Domingo reparei nele!
Regresso? Doença? Xiii... não percebi :(

Jinhos.

Joana disse...

Hum... como explicar... Filosoficamente, metaforicamente se quiseres, o regresso é algo contra-natura (nunca se regressa efectivamente, porque já somos outros, sempre, para o bem e para o mal), daí o paralelo feliz com a doença. Por outro lado, temos os regressos efectivos a países e casas e situações que às vezes coincidem com alguma doença de coração, não cardíaca, não coronária, mas de coração e daí o paralelismo também é feliz...

Relativamente ao meu caso específico, foi uma semana de regressos (à minha vida, por momentos) de pessoas e situações que ficaram lá atrás... E ainda bem. (A bem da saúde pública em geral e da minha em particular) :P

Jinhos.

Marta disse...

A doença não é contra-natura, é uma maneira de nos fortalecermos e "regressarmos" à vida mais fortes, com uma perspectiva diferente, logo, a doença obriga-nos à mudança sob pena de sucumbirmos. A nossa doença e a dos outros, a daqueles que nos importam, obrigam-nos a regressar, a voltar a nós, a combater coisas que já tinhamos esquecido e depois ficamos mais saudaveis e diferentes.

O regresso e a doença não são necessariamente maus porque conduzem a uma mudança desejada e/ou necessária, se deixarmos. É esta a semelhança que encontro :)

Jinhos enormes!