segunda-feira, abril 06, 2009

Vou almoçar com o punhado de amigos que as distâncias e o trabalho não conseguiram engolir desde a Faculdade. Todas as férias de Natal, Páscoa, Verão, o almoço do costume, no sítio do costume, meeting-point à porta da Faculdade, para não se esquecer nunca, à hora do costume também.

Estás mais magra, cansada, tão gira, que contas, então e o, sempre conseguiste, não ias, quando vais, é verdade que, lembram-se do, e o, então esse, e a, já tinha ouvido qualquer coisa, não fazia ideia, nunca me teria ocorrido, não sabias, não, soube agora, sim, disse-me.

Mais ou menos a meio do elenco de novidades, algures entre o lembram-se do, da, que era não sei quê não sei de onde, nunca me lembro – é escusado: com os anos tenho apagado ficheiros e ficheiros de imagens de pessoas da Faculdade com que nunca me dei, por precisar urgentemente de espaço para o que me é realmente importante –, sopro para o lado, às vezes só respiro, mas profundamente, ainda assim só respiro, para não ferir susceptibilidades... A Helena percebe-me. E ri-se quando acaba de desviar o olhar para responder às lembranças e aos reparos e às novidades de toda a gente. A Helena é maravilhosa. Tanto conversa dessas coisas, como das outras, as mais do meu género. O Edu percebe e dá-me um riso pequenino, solidário. Volta ao prato, come. Volto ao meu, como também. (É quando penso no quanto podemos ser amigos, todos, e no entanto, crescermos em direcções separadas, alguns. E não deixarmos de ser amigos por isso. E no entanto.)

Depois de porem as novidades em dia, lembram-se dos calados, o Edu e eu. Interrogatório individual do tipo Gestapo. (É quando penso na utilidade da banalidade, do tempo, da crise, da quadra, das férias, da banca, da corrupção, da bola, da utilidade que é ter-se outros de que falar, quando se quer fugir.)

No fim, satisfeitos os apetites, beijinho, beijinho, até à próxima, vamos, os restantes, tomar café ao centro. Se a Helena não vem, o Edu e eu à frente, à procura de sol e sossego. Atravessamos para o outro lado da rua, o que tem passeios, cruzamos subidas e descidas apertadas, chegamos à esplanada do costume, sentamo-nos, o Edu acende um cigarro. Que contas? (É quando começo a descansar realmente na cadeira e na tarde.) Vi-te no outro dia, li, no jornal, estava lá na Escola e como começo a ler pelo fim, foi logo: eu conheço esta menina!... Pois, mas só porque não mandaste o teu, Edu. Viste o mail sobre esse concurso precisamente, o mail que te mandei há dias? Sabes como é, não tenho tempo... Chama-lhe tempo, Edu, isso, chama-lhe tempo... Se a Helena vem, ela connosco, nós os três à frente, nós dois a atravessarmos as ruas, os passeios, as palavras, nós os dois a subir e a descer muito nas conversas, para fintarmos as preocupações emocionais que damos à Helena. A Helena é uma boa amiga, a minha melhor, mas acha que a felicidade é uma palavra erradamente enunciada no singular. Coisas...

Um dia fui a correr para a Madeira porque, quando não é preciso, o tempo existe e esvai-se assustadoramente de uma ampulheta que o coração faz pender sobre a nossa cabeça. Nesse Verão difícil, cresci muito, – acho que morri, tinha morrido cá antes, muito antes de ir, quase – impossível perder o coração duas vezes! – morria outra vez lá depois, mas sei que morri pois só morrendo se renasce, se pode renascer, crescer assim. Num fim de tarde depois da tempestade de lá liguei-lhe e fomos tomar café, eu e o Edu, mais amigo dos amigos, que meu, mais confidente de uma ou outra amiga, que meu, uma série de coisas que sempre me passaram ao lado, tal como ele, se a minha melhor amiga Helena não o tivesse em tão alta conta e não me tivesse encomendado o tal cafézinho porque caramba! ele está lá na tua terra, bem longe daqui, não lhe deve ser fácil, vá lá. O Edu. Sem saber, ou sabendo – é homem de muito mundo! – deu-me uma prelecção sobre a Lucidez, que foi das maiores lições de vida da minha vida. É o único destes meus amigos de Faculdade que sabe que eu escrevo, por exemplo. E isso, o que isso implicou, isso, é segredo trancado no cofre do peito que a Helena teima em abrir ao sol.

Nada de que se vá falar hoje na esplanada. Chove. E a Helena não vem.

13 comentários:

Ouriço-Cacheiro disse...

um dia destes escrevo uma coisa assim... sobre os do liceu e os da faculdade, para me (re)centrar. Um dia que esteja a chover (aqui chove tão pouco...).

;-)

Ouriço-Cacheiro disse...

Teb«nho coisas destas, destes encontros, guardadas também. Um dias destes escrevo. Num dia de chuva e aqui chove cada vez menos...

Joana disse...

Ouriça,

Aqui chove taaaaanto...!
Trocamos? :P


Jinhos.

Joana disse...

Tanto... tantos dias, semanas a fio, lá fora, cá dentro, agora não, hoje não, mas muito, quase sempre. Braga é assim...!

;)

Jinhos.

V. disse...

ontem um passarinho avisou-me que aí por braga esteve a rtp. todos enfiados no café vianna! eheheh! estivesse sol e iam todos correr à volta da fonte! :p (digo eu!)

sabes, os meus almoços e jantares com o pessoal da universidade são sempre tão raros e surreais que um dia destes merecem um destaquezinho... :D e caramba, apetece-me ir já a correr para ai, quero lá saber da chuva!!!

beijinho*

Joana disse...

Vanessa,

Pois foi!

(Altos contactos passarescos que a menina tem! :P...)

"Podes vir a qualquer hora..." mas diz que nas manhãs é que não há caves... :)))))))))))))))))))))))

Jinhos.

Maria Rita disse...

Oh Joana, eu acho muito mal o Edu ser o único amigo da Faculdade a saber que escreves! Toda a gente devia ter o prazer de ser tocada pela tua escrita magnifica. :))

Um beijinho cheio de coisas boas*

Joana disse...

Frida,

Eu também acho muito mal... :((((

(Curiosamente, apaguei do texto o parágrafo, final, em que dizia ser essa uma mágoa minha. É mesmo! Talvez um dia...)

Beijo grande, Rita.

100 remos disse...

Boa Páscoa! Miss you :( Bjinho

tchi disse...

Re.encontros.

Re.estabeleceres.

Re.conheceres.


Feliz Páscoa.

Beijinhos jj.

Doppelganger. disse...

Acho que não devíamos de ter medo de revelar que escrevemos, dos teus textos sai sempre algo bom, tens sempre uma virtude que é conseguir manter tudo objectivo, a partir daí é so coisas boas. :)

De vez em quando também tenho jantares desses, mas do liceu ainda, e são tão cromos.


Beijinho*

Joana disse...

100remos,

Miss you too, Rute...

Tchi,

Que belo comentário! É isso tudo, é isso mesmo. A melhor Páscoa, a maior, grande como sempre, como só pode em Braga, Helena.

Joana disse...

Panzón,

Um dia destes, trazes a tua menina e jantamos, vais ver o que é cromice no seu melhor... :P

Jinhos doces de Páscoa, Pedro.