Nunca pedir um minuto a um amigo. Um minuto nunca é um minuto, nunca, jamais, e então se for descontado ao tempo de um amigo... Bem, a Sílvia entreteve-se com o telemóvel no minuto que foi mais de uma dúzia deles ante a perspectiva de uma incrível sessão fotográfica à Joana-trabalhadora-em-frente-ao-pc-ao-fim-do-dia. A Sílvia veio para o lar numa altura em que, para o não fecharem, as Irmãs abriram-no a não-universitárias. Lembro-me bem da mudança de placa: onde antes se lia ‘Lar Universitário’ fixava-se agora ‘Lar de Estudantes’, lembro-me que ia para as aulas da tarde, e que ao sair, Menina, não feche o portão!, não consegui deixar de migrar da placa antiga, caída no degrau, para a outra lá em cima, e de pensar em como, antes de morrer, tudo se transforma.
Só mais um bocadinho Sílvia, está bem?, tenho ainda de responder a uns mails, mas... cuidado!, sai daí debaixo, miúda!, este gabinete não é só meu, sabes?, por acaso a esta hora não está cá ninguém, mas... Verdadeira lufada de ar fresco naquele fim de Verão, a Sílvia preenchia o silêncio às refeições, sobrepunha-se aos ecos nos corredores, enchia aquela casa tão vazia de uma alegria nova. Falava muito e alto, comia muito e bem, asneirava com graça, fartavamo-nos de rir..., não sei se do sotaque, se da preponderância do calão, se da inclinação para feiosos e historietas do arco-da-velha... Ainda te magoas, rapariga!, Oh esquece isso, quero apanhar-te o sapatinho, fazem-te mais velha, mas são giros... O sapatinho?!, oh, não sejas, palerminha! Vinha para o nono ano, por coincidência o mesmo ano de uma das minhas turmas de estágio, trata-se mais de uma espécie de apoio, entendes, Joana? Entendi e em três tempos rendi-me. Ficámos amigas. Mas foi duro.
Joana, é a Mariana, a Sílvia não quer tomar banho. A Sílvia, o quê? Diz que está muito frio, que os balneários ficam longe, que não vai agora até lá abaixo ao fundo do corredor porque a primeira aula da manhã é Física e assim toma lá na Escola. Ok, já falo com ela. Joana, é a Mariana, a Sílvia não quer ir às aulas. A Sílvia, o quê? Diz que tem dores de barriga, que vai vomitar, que amanhã pede à stôra para fazer o teste, que não tem condições. Ok, já falo com ela. Joana, é a Mariana, olá. Olá, por aqui? Precisava de falar contigo. Muito bem, entra. Está tudo bem? Os testes? A Sílvia tem colaborado mais na limpeza do quarto? Sim, não é isso. Então?... É que, ela..., ela..., a Sílvia, ... a Sílvia só tem dois soutiens. O quê?
Há uma altura da vida em que a velocidade de crescimento dos filhos ultrapassa a velocidade de percepção dos pais, tenho a certeza. Normalmente coincide com pontos de viragem profissional, a chamada progressão na carreira, parece-me. A miúda estava no liceu, tinha uns pais informados, muito colaborativos, ia a casa todos os fins de semana, e no entanto... Então Sílvia, eu estava aqui a pensar..., tu e a Mariana não têm aulas agora e eu tenho de ir às compras, querem vir comigo? Mentirosa e gastadora. Era uma rapariga muito mentirosa e gastadora naquela altura, coisas que - agora que penso nisso - nunca mudam...
O tempo correu, passou pela miúda, por mim que me mudei para o Porto... O tempo continuou a correr, ela foi para a Faculdade, eu para os EUA. Foi no outro lado do mundo que soube do namorado, de tudo o mais que o Amor lhe trouxe e de que, quando for, serei madrinha. Seja. Encontramo-nos mais quando ela tem trabalhos para corrigir, Sílvia, já te disse o quanto progrediste desde que te conheci naquele Verão?, cresceste muito, sabes?, amadureceste, e no entanto continuas ... igual!, tenho muito orgulho em ti, Eu sei..., Sabes?!, Então agora corta isto, passa este parágrafo para a conclusão, mau, mau... hoje estás esquisita, inquieta, passa-se alguma coisa? Oh, só isso?, quando for, tenho muito gosto em vo-las oferecer, escolhes tu, as que quiseres, ok?, Agora explica isto melhor, não se percebe muito bem, olha aqui, isto não faz sentido, ora lê, esqueceste-te de qualquer coisa, de certeza...
Joana, viste?, aquela rapariga ali está apaixonada! Está?, não vi... Então, olha para trás, vês como tecla com um sorriso do tamanho desta Biblioteca? Vejo, sorrio, Sim, Sílvia, realmente tens razão. Que bom!, não é? Sim, Sílvia, que bom!, mas olha que tu também não tens muito de que te queixes, vá..., trabalhamos?, Sim.
Vinte segundos depois... Joana? Diz. Lembras-te daquela noviça gira que ia à missa lá ao lar, a que era psicóloga e decidiu ser freira por causa de um desgosto de amor? Não, por acaso não. Não te lembras? Não, não me lembro, nem da noviça, nem dessa história, agora trabalha, vá... E daí, espera um minuto: Achas-me com cara de noviça, Sílvia?
Só mais um bocadinho Sílvia, está bem?, tenho ainda de responder a uns mails, mas... cuidado!, sai daí debaixo, miúda!, este gabinete não é só meu, sabes?, por acaso a esta hora não está cá ninguém, mas... Verdadeira lufada de ar fresco naquele fim de Verão, a Sílvia preenchia o silêncio às refeições, sobrepunha-se aos ecos nos corredores, enchia aquela casa tão vazia de uma alegria nova. Falava muito e alto, comia muito e bem, asneirava com graça, fartavamo-nos de rir..., não sei se do sotaque, se da preponderância do calão, se da inclinação para feiosos e historietas do arco-da-velha... Ainda te magoas, rapariga!, Oh esquece isso, quero apanhar-te o sapatinho, fazem-te mais velha, mas são giros... O sapatinho?!, oh, não sejas, palerminha! Vinha para o nono ano, por coincidência o mesmo ano de uma das minhas turmas de estágio, trata-se mais de uma espécie de apoio, entendes, Joana? Entendi e em três tempos rendi-me. Ficámos amigas. Mas foi duro.
Joana, é a Mariana, a Sílvia não quer tomar banho. A Sílvia, o quê? Diz que está muito frio, que os balneários ficam longe, que não vai agora até lá abaixo ao fundo do corredor porque a primeira aula da manhã é Física e assim toma lá na Escola. Ok, já falo com ela. Joana, é a Mariana, a Sílvia não quer ir às aulas. A Sílvia, o quê? Diz que tem dores de barriga, que vai vomitar, que amanhã pede à stôra para fazer o teste, que não tem condições. Ok, já falo com ela. Joana, é a Mariana, olá. Olá, por aqui? Precisava de falar contigo. Muito bem, entra. Está tudo bem? Os testes? A Sílvia tem colaborado mais na limpeza do quarto? Sim, não é isso. Então?... É que, ela..., ela..., a Sílvia, ... a Sílvia só tem dois soutiens. O quê?
Há uma altura da vida em que a velocidade de crescimento dos filhos ultrapassa a velocidade de percepção dos pais, tenho a certeza. Normalmente coincide com pontos de viragem profissional, a chamada progressão na carreira, parece-me. A miúda estava no liceu, tinha uns pais informados, muito colaborativos, ia a casa todos os fins de semana, e no entanto... Então Sílvia, eu estava aqui a pensar..., tu e a Mariana não têm aulas agora e eu tenho de ir às compras, querem vir comigo? Mentirosa e gastadora. Era uma rapariga muito mentirosa e gastadora naquela altura, coisas que - agora que penso nisso - nunca mudam...
O tempo correu, passou pela miúda, por mim que me mudei para o Porto... O tempo continuou a correr, ela foi para a Faculdade, eu para os EUA. Foi no outro lado do mundo que soube do namorado, de tudo o mais que o Amor lhe trouxe e de que, quando for, serei madrinha. Seja. Encontramo-nos mais quando ela tem trabalhos para corrigir, Sílvia, já te disse o quanto progrediste desde que te conheci naquele Verão?, cresceste muito, sabes?, amadureceste, e no entanto continuas ... igual!, tenho muito orgulho em ti, Eu sei..., Sabes?!, Então agora corta isto, passa este parágrafo para a conclusão, mau, mau... hoje estás esquisita, inquieta, passa-se alguma coisa? Oh, só isso?, quando for, tenho muito gosto em vo-las oferecer, escolhes tu, as que quiseres, ok?, Agora explica isto melhor, não se percebe muito bem, olha aqui, isto não faz sentido, ora lê, esqueceste-te de qualquer coisa, de certeza...
Joana, viste?, aquela rapariga ali está apaixonada! Está?, não vi... Então, olha para trás, vês como tecla com um sorriso do tamanho desta Biblioteca? Vejo, sorrio, Sim, Sílvia, realmente tens razão. Que bom!, não é? Sim, Sílvia, que bom!, mas olha que tu também não tens muito de que te queixes, vá..., trabalhamos?, Sim.
Vinte segundos depois... Joana? Diz. Lembras-te daquela noviça gira que ia à missa lá ao lar, a que era psicóloga e decidiu ser freira por causa de um desgosto de amor? Não, por acaso não. Não te lembras? Não, não me lembro, nem da noviça, nem dessa história, agora trabalha, vá... E daí, espera um minuto: Achas-me com cara de noviça, Sílvia?
10 comentários:
Tu, com cara de noviça? É por seres gira :))
Ehehehe! Adorei o texto. Parecia que estava a espreitar-vos enquanto a Silvia estava no Lar.
Jinhos!
Parabéns pelo texto Joaninha, de uma simplicidade e de uma oralidade notável.
Não tens cara de noviça! :)
Beijinho*
Marisa e Pedro,
Obrigada. :))))))))
É sempre bom saber, acho que sou mais "do tipo cara valente", mas é sempre bom saber... ;)
Jinhos a ambos.
eu cá não acho nada, não. :)
(amanhã talvez apareça em braga.)
beijinho*
Vanessa,
Aha! :)))))))))))))))))))))))
A sério? É que se esse talvez for meio sim, bem três quartos de sim... eu também! :P
Até amanhãaaaaaaaa!!! :P
Jinhos.
simmmmmmmm! :)
Vanessa,
Pois que até o sol espreguiçou um raiozinho para este meu lado agora...
Té amanhãaaaaaaaaaaaaa! :P
Um texto envolvente e muito muito bonito. Gostei mesmo.
Adorei, adorei. Mesmo. E não, também não acho que tens cara de noviça. És tão bonita! (-e não, não quero com isto dizer que as noviças são feias, apenas me lembrei!):))
Um beijinho*
Frida,
Adorável como sempre... :))))
Jinhos, Rita.
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