sexta-feira, maio 15, 2009

Termitidae


Estou indecisa sobre qual o mais potencialmente destruidor: o caruncho ou a formiga branca? O caruncho é bem mais conhecido, pelo menos aqui no norte, por bicho-da-madeira. Acarinho todo o caruncho, tive por um princípe assim designado uma paixoneta que teria sido de caixão-à-cova não fosse o que foi, e guardo boas recordações do bicho-da-madeira, o meu nome de praxe, pelas razões mais óbvias.

O meu avô é que costumava falar muito no caruncho e na formiga branca, especialmente por alturas do Natal ou do fim-do-ano, ou ainda quando vinha uma visita importante que recebíamos na casinha de prazeres – uma espécie de jardim de inverno madeirense... Havia lá dentro, à esquerda de quem entra – lembro-me bem –, um aparador de que a minha avó gostava particularmente, herdado não sei de quem, comprado com sacrifício pelo mesmo e mantido com um carinho e um fervor quase religiosos, um aparador velho, todo ele buraquinhos, caruncho... E a cada entrada, de cada vez, o meu avô, temos que o deitar fora porque num instante passa para o soalho e, bem, pelo menos não é formiga branca, é que a formiga branca dá cabo de uma casa.

A formiga branca dá cabo de uma casa. A formiga branca mais não é que a designação genérica das térmitas. Térmitas parece-me um nome terrível, cheira-me a peste, soa-me a recolher obrigatório em abrigo subterrâneo, devorador, apocalíptico, é a face do mais completo terror, de toda a destruição e muito medo. Se calhar não é mais destruidora que o bicho-da-madeira, mas impõe-se: ter-mi-ti-dae, tenha meeeedo.

É que a formiga branca dá cabo de uma casa. Algumas palavras também. Ditas, às vezes mais ou menos ao acaso, às vezes deliberadamente, o que é que tu vês nele?, ouvem-se, e são como a formiga branca: dão cabo de uma casa. Às vezes, ainda bem.

Mas nem era bem nisso que estava a pensar. Era mais no oposto. Na realidade, estava a pensar em como nunca digo, em como, sei demasiado bem porquê, tenho o hábito, execrável, de guardar térmitas no bolso. Enquanto tiro o sorriso número quatrocentos e quarenta e três cá para fora. Enquanto faço silêncio e olho para os sapatos. Enquanto recupero o quatrocentos e quarenta e três e falo do tempo, do défice, de pais e de filhos que conheço, de livros e daquela viagem. E as térmitas vão subindo, bolsos acima, coração de pau adentro.

12 comentários:

miradouro das cruzes disse...

Amiga Joana,
Apesar do meu silêncio (falta tempo para tantos afazeres), continuo a ver o seu cantinho. Esta questão de ter de optar entre carunchos e formigas brancas, é complicado! A formiga voa, o que é desagradável... lembro-me de uma casa na Rua da Carreira que infectada acabou por desmoronar! Hoje nos antiquários, fazem de propósito pequenos orificios a imitar o caruncho para dar um "ar de um móvel muito antigo".

miradouro das cruzes disse...

Amiga Joana,
A imagem que anexou está a precisar de um fugicida!... Um coração desses não pode ter pragas, só coisas boas!

Joana disse...

Loo Rock,

Por causa das coisas más e das outras, dos anos e dos outros, todos, este coração faz por ter só coisas boas. :)))

Jinhos.

P.S. A Madeira é realmente pródiga na praga da formiga branca e em carunchos principescos. Ehehehe!

Marcelino Teles disse...

Por falar em Formiga Branca não é que eu um dia, uma meia dúzia de anos atrás foi apelidado de Formiga Branca por ter apresentado uma candidatura a umas eleições do clube de Santana!!
Quem apelidou?
R: - Dr. Alberto João Jardim, no Diário de Noticias da Madeira.
No meu blogue ainda se pode encontrar vestígios de tal, como por exemplo em:
http://berdades.blogspot.com/2006/03/ser-formiga-branca.html

V. disse...

eu não sei qual o mais destruidor. sei que este deve ter sido um dos teus textos que mais gostei aqui. não me perguntes porquê. acho só que todos nós guardamos algumas térmitas nos bolsos...

beijinho*

Maria Rita disse...

Que não hajam muitas formigas brancas a destruir muitas casas.*

Este último parágrafo está absolutamente delicioso. Entretanto, com ele, descobri que também tenho térmitas no bolso e nunca me tinha dado conta.

Um beijinho*

Joana disse...

Berdades,

Seja bem-vindo!

Já andei pelo seu cantinho também: ser chamado de 'formiga branca' não é lá muito elogioso, de facto...

Santana é que é uma bela terra de pessoas de valor e trabalho! :)))

Vanessa,

Depois de um comentário assim, aiiiiiiiiiii elogioso, vindo de ti, e tudo e tudo, como é que eu vou continuar a escrever?! Atingi o topo! :P

Frida,

Exactamente. :))))))))
"Que não haja muitas formigas brancas a destruir muitas casas."

Jinhos a todos.

Oásis disse...

As térmitas no bolso ajudam a CRIAR bons textos! (tinham de ter alguma utilidade, não é?)

Jinhos gandes e as melhoras, miga!

p.s.- casamenteira, maternal... tenho de controlar estes impulsos todos, rsrsrsrs

Joana disse...

Marisa,

Bem-visto! ;)

Não tens de controlar nada, és per-fei-ta para mim assim. :)))

Jinhos.

Joana disse...

Dei-te essa impressão no outro dia..., tu não ligues, rapariga, que uma pessoa a modos que perde noção da realidade, é a tal da perda da plena posse das faculdades, quando fica doente, oki? :))))))))))

:*

Ouriço-Cacheiro disse...

as térmitas gostam sempre de madeira de boa qualidade!
;-)

Joana disse...

Ouriça,

Aha!!!!!!!!!!! Agora ia acontecendo quase a WW III, todo um splash de vitamina C por cima do teclado, ri-me:

OBRIGADA! :D


Jinhos.