domingo, dezembro 10, 2006

Bad Day

As coisas más são como as cerejas. Vêm todas juntinhas, umas arrastam as outras, e um punhado nunca é o bastante! As boas, como a maçã que cai da árvore. Una. Única. Cai-nos no colo. Sem razão aparente. E, claro, num instante, tsharã……!!!!!!, nos esfrega a relatividade bem nos olhos e na cara. Não a da massa, embora essa também, a relatividade da vida, feita de más e boas coisas, em proporção e intensidades variáveis.

Ontem caí. Como sempre, quando se cai, por uma razão absurda. Caí, magoei-me, a mim e só a mim – ufa!, fiz uma figura triste, preocupei a envolvência, que não se riu, curiosamente, (ah, pois, não estamos em Portugal!...), e passei a conhecer-me muito melhor – vantagem primeira, senão única, da queda. Das quedas. De qualquer queda.

Fui para casa. Limpei a ferida, desinfectei-a, não pus gelo, pus-me à janela – os cinco graus dos últimos cinco dias têm afinal uma utilidade – terapêutica –, fui para dentro, tentei ver televisão, aguentei, estóica, séculos de The School of Rock e de The Wedding Singer, até que finalmente apanhei, valente, o The Lord of the Rings a cinco minutos do final. Snif! Um calor mau circundava-me a ferida. Eu adoro calor. O calor só me lembra coisas boas: o abraço da minha mãe, as suas mãos a massajarem-me os pés, as sopas da minha avó, chá, chocolate quente, a minha cama, as minhas mantinhas, ou um qualquer sofá bom. (Há também aquela versão do calor bom da praia, dos gelados e dos surfistas simpáticos – se bem que eu acho que a simpatia deles é inversamente proporcional ao tamanho do biquini do objecto “simpaticado”, todavia, como não vem muito ao caso, esqueçamos…) Mas este calor era mau. Além de quente, a ferida estava a arder, não do calor, mas de dor. Eu achava que apenas a paixão e a vontade, quando são muito, muito grandes, doem, ardem e levam uma pessoa a agir: a fazer umas quantas loucuras boas que a tornam feliz. Não. Pelo menos, não em exclusivo. As feridas também ardem, e não propulsionam ninguém a qualquer tipo de acção – que não se resuma a um ou outro gemido ocasional – e muito menos à felicidade!

Não estou sempre a cair, mas não é a primeira vez que caio. Não sei porque caio, sei que caio apenas. A minha mãe, outrora, achava que sabia porquê e até costumava brincar com isso, para disfarçar a preocupação – nessa altura caía com demasiada frequência. Oscar Wilde dizia que – vou parafrasear porque a memória emigrou-me para os joelhos, não me recordo ao certo – vivemos todos numa pocilga em que apenas alguns, os sábios, ousam olhar para as estrelas. A minha mãe acha-me mais néscia que sábia, mas era capaz de concordar com o Sr. Wilde porque diz que o mal era eu andar sempre cabeça no ar… Quedas de outrora. Quedas de miúda.
Também não sei explicar muito bem, mas … paredes, pessoas e postes vinham todos na minha direcção! “Eu é que tenho de me desviar, é?” “Porquê? Porque é que as pessoas não olham para onde vão?” “Eu… eu olhei, bem estava a olhar, por acaso para outra coisa, mas… os adultos são eles!” “Os postes… pois, não estavam aqui da última vez. Estavam mais para ali, certo?” “Então deviam estar!” A queda de ontem foi diferente. Não me lembro para onde estava a olhar, mas nada veio ao meu encontro. É estranho dizer que fui eu ao encontro da queda, até parece propositado, mas foi qualquer coisa assim. No imediato não ma apercebi, mas magoei-me à séria. Claro que podia ter-me magoado mais, ter partido um osso ou, no mínimo, torcido um pé, o pé, o esquerdo – como sempre!. Não. Ao invés, esfolei os joelhos, o direito quase nada, o esquerdo, agora batata lilás, amarela e caqui, bem esfolado, feita menina traquinas. Deve ter muitas histórias para contar, este meu joelho esquerdo. Que me lembre, esfolei-o três vezes, e das três o caso foi feio. Com direito a derme no passeio da primeira vez, nos collants da segunda e no fato de treino, ontem. Se calhar o meu pé de apoio é o esquerdo. Só isso explica que esse meu joelho arque sempre com as consequências da minha inata distracção. Devia saber disso das aulas de Educação física, mas essas sempre me doeram mais que mil joelhos esfolados, portanto não sei. O que sei disto é muito pouco, aliás. Sei que calçar as meias, dobrando o mínimo possível as pernas, é um desafio só digno do equilibrista circense que anda na corda bamba; sei que dormir de barriga para baixo só daqui a uns bons dias quando suas excelências o permitirem; sei que o chão alcatifado da capela, apesar do aspecto acolchoado e fofinho, continua a ser chão e portanto suas excelências pedem que aguarde uma semana – no mínimo! – até à minha próxima genuflexão automática; sei que recostar-me para trás na cadeira e conversar longamente com os colegas é bom, mas melhor será quando me for natural substituir o trocar de pernas para a direita, com o simétrico – como é possível que um arranhão de um centímetro na minha rótula direita seja caprichoso ao ponto de me fazer dizer aiiiiiiiiiiii ante a sobreposição, mais ou menos automática, mais ou menos cuidada, leve e carinhosa, da minha tão maltratada perna esquerda?

Bem, falta o resto das cerejas que pendem das acima. As cerejas do cotovelo direito que, moído por ter servido ontem de amparo, farta-se de doer – para chamar a atenção? –; as cerejas do pesadelo desta noite, em que a Mariana me tirava o comando da tv e me impedia de ver milhentos jogos da Selecção Nacional em que o Baía era titular, meu único consolo ante a desorientação provocada pelo facto de a Michelle Pfeifer ou a Maria Elisa, ou um misto de ambas – yuck! –, me terem feito uma limpeza ao baú-das-coisas-que-já-quis-mas-de-momento,-não-obrigada e me terem levado o ex, um anorak e o um relógio Calvin Klein; as cerejas dos ouvidos que estalam e doem desde o início desta frente fria; as cerejas do nariz incomodado desde a mesma altura, as cerejas das dores de barriga desde esta manhã; as cerejas do cinzento do dia e da chuva que cai lá fora; as cerejas das saudades que eu tenho das enormes castanhas assadas do senhor do Marquês; as cerejas das saudades que eu tenho; as cerejas de todo o trabalho que tenho para fazer; as cerejas de toda inércia que todas estas outras cerejas causam em mim…

Acho que vou comer uma maçã.

13 comentários:

Joana disse...

Ehehehehehehehe!!!!!! Animaste-me! Mais do que a maçã - bem, ainda nem vou a meio... - ainda bem que a reportagem correu bem. Outra coisa não seria de esperar... :P

Jinhos.

P.S. "Boas conversas" - eheheheheheeh!!!!!!!!!!!!!

Anónimo disse...

Uma maçã inteirinha para ti. E sabes o que é melhor? É que as maçãs também têm plural ;)

Joana disse...

Cientista,

Touché. Mais palavras... what the hell for?

Jinhos.

K. disse...

An apple a day, the doctor away... afinal o dia não acabou mal... ;)


Beijinhos!

Joana disse...

K.,

Nada mal. Thank YOU.

Beijo grande.

P.S.1 I owe you a tone of apples. Do they have apples in Sabah? :P

P.S.2 ALL the doctorS away! Yey!!!

rui disse...

Olá JJ

Bom dia!
Isto é, espero que sim e, sem quedas!
E nem estamos no tempo das cerejas!
Toca a comer maçãs.
Espero que essa recuperação seja rápida.

Beijinhos

psique disse...

JJ, percebo-te! A minha mãe não leu O. Wilde e portanto dizia perentoriamente: "não sabes andar!" e pronto!
Mas ainda hoje não percebo, porquê as paredes de casa e as portas ainda vêm de encontro a mim!
Acho q realmente é elhor e comer uma maçã.
As melhoras!

Erecteu disse...

Se os azares são como as cerejas as palavras ainda não o deixaram de ser.
Perdoa-me se te digo que o azar bendito é pelo texto que proporcionou.
Um beijinho

Rosario Andrade disse...

Bom dia JJ!
...realmente sao muitas cerejas juntas!...
Os meus joelhos também sao grandes martires. Toma conta da ferida para que nao infecte, senao estarás ainda em pior lençois!...

Sabes, ainda nao te disse mas adoro a tua maneira de escrever edescrever as coisas e de divagar um pouco, como se estivesses a escrever com o coraçao. Absolutamente delicioso!

Bjicos

Maria de Lourdes Beja disse...

Agora pense nas consequências e perigos que advêm a quem se desiquilibra por"dá cá aquela palha" e tem osteoporose desde os 40...Talvez um dia possa contar-lhe algumas histórias de joelhos...Por agora, só posso ajudá-la avaliando, por experiência, "a dor que deveras tem"...Das luzes da MADEIRA creio que sei tudo...Um dia conto...Bjs.

Joana disse...

Rui,

Farei por isso!

Psique,

Eheheheheheh!!! Estranho este animismo dos objectos our way... ;)
Um beijo especial para ti por comentares pela primeira vez.

Erecteu,

You're so sweet! :)

Rosario,

Filha de enfermeiro, irmã de medica, se não desinfectasse bem a dita não era a septicemia que dava cabo de mim, eram mesmo eles! (Adora? Obrigada!!! Escrevo mesmo com o coração - e sim, divago porventura demasiado, males de um coração sem método... ;)

Maria de Lourdes,

Voltou!!! Um xi-coração para si. Senti saudades suas. (As fotografias da Madeira eram uma provocaçãozinha para voltar a estas bandas. ;) Já me apercebi que conhece bem aquilo... Aguardo que conte. :P)
Osteoporose? :(
"...consequências e perigos...", disse muito bem - agora avalio, sim.

Jinhos a todos e um abraço apertadinho a cada um por me terem feito esquecer os joelhos.

P.S. I'm so very lucky to have you here! You're all in my heart! ;)

Anónimo disse...

Descansa mas é um bocadinho, deixa que as cerejas passem ao lado, e pelo sim pelo não encomenda um quilo de maçãs. ;)

Joana disse...

Pec,

Apples - ordered. Rest - done. ;)

Jinhos.

P.S. POOOOOOORRRRRRTTTTTTTOOOOO!!!!