A minha rua é uma rua pequenina, paralela a uma rua grande - das maiores que o Porto tem... - ladeada à esquerda por prédios antigos, à direita por prédios antigos, a minha rua é uma rua escura e velha, mais escura e mais velha do que eu desejaria, menos escura e menos velha que as muitas ruas pequeninas desta cidade.
Na minha rua, em frente ao meu prédio, abaixo da janela do nosso escritório, exactamente onde escrevo agora, há uma casa - a única casa da rua -, uma casa grande e bonita, com uma grande varanda a abraçar as duas bonitas águas-furtadas, com um jardim a condizer, com umas hortenses... que explodem brancas, rosa, lilás e azuis, deste jardim tão vivo, tão verde, tão familiar, que muitas vezes dou comigo a sacudir a mochila para o chão e a sorver-lhes com os olhos o orvalho, no regresso a casa da escola, ao invés de trabalhar.
Há tempos, vinha de uma festa, era tarde, não, era cedo - manhã cedo -, e os amigos que me davam boleia faziam-no curiosamente pela primeira vez. Dei-lhes as indicações do costume, chegámos rápido, a rua deserta, a rua a dormir, e eles estacionam antes do meu prédio e do outro lado da rua. À porta desta casa. Eu a perguntar-me porquê, eu a agradecer, eu a despedir-me, eu moro ali. Ali?, então espera, levamos-te lá, pensei que era aqui, esta casa tem tudo a ver com, esquece, e entra novamente, se fazes favor. Acho que estávamos todos com demasiado sono para nos alongarmos em teimosias. Entrei, em vinte segundos estava à porta do meu prédio, acenei adeuses, entrei, liguei a luz da entrada enquanto a porta deslizava-se-me e eles aceleravam para casa, também.
Depois disso, inevitável, ficou aquela ligação sonolenta e ébria - e amiga - a vibrar-me dentro na memória. E foi assim que todos os meus dias sozinhos de Agosto terminaram aqui à janela a olhar para baixo. Eu a observar a vida de Verão desta casa que tem tudo a ver, mas não é, que a minha vida e a minha carteira ainda não deixam, e não sou rapariga de grandes devaneios e desobediências.
Estes dias, andou em obras. Pinturas. Vieram cá uns senhores, dois ou três - nem sei ao certo, mas três -, montaram andaimes, fartaram-se de andar no telhado - um, mais que os outros, fartou-se de andar no telhado -, fartaram-se de cantar pérolas pop que não ouvia desde o Secundário - o do telhado mais que os outros, esgoelar-se é coisa própria da juventude, as pessoas de todos os dias todo o dia da casa substituídas por estas pessoas, e o Red red wine, e o Unbreak my heart, e o Hero, e o I have nothing, Rádio Renascença, das oito às seis.
A minha mãe é que havia de gostar desta casa, também. Eu e a minha mãe coincidimos sempre nos gostos - bem, em quase todos os gostos, estava a pensar agora que em matéria de estética do sexo oposto, nem por isso, geracionalidades... A minha mãe diz que as casas, como as pessoas, têm que se arranjar sempre muito mais assim que o tempo começa sulcar o seu caminho à superfície.
Obras de restauro. Às vezes, é preciso, muito. E os Verões são a isso bem propícios. Nem que seja por um bouquet de hortenses.
11 comentários:
Sinto-me a precisar de uma obra de restauro...
Hoje estive no Porto, pela manhãzinha, fui a Santa Catarina e depois caminhei até Cedofeita, soube bem...
Bonito o texto,
um beijinho
Dançando,
Sou suspeita para falar, mas é tudo uma questão de não pensar, arranjar como não pensar. ;)
Gosto desse passeio. Amanhã darei um parecido, com amigas. Tão bom!
Jinhos.
tenho a dizer que a minha vida acabou de mudar completamente assim que descobri o nome dessas flores! ahahah! obrigada! :p
(já deves adivinhar quais é gosto mais aí! lol!)
até loguinho*
Vanessa,
Liiiiiiiiiiiindo!!!
Hum... é a segunda vez na vida da nossa amizade que me sinto a modos que guru. Ahahahahahah!!!
Té logo!
Jinhos.
Se a casa é a da foto, eu diria que tem mesmo a ver... :)))))
Um beijinho Joana*
Frida,
Oh, tão linda! *
Não é a da foto, mas é parecida... ;)
Jinhos.
é bom poder regressar à doçura das tuas palavras, deste e dos posts anteriores. a tua escrita tem alma para andar, seja isso o que for :)
Comboio,
É bom apanhar-te de volta! ;)
Não digas isso muitas vezes que um dia ainda me convenço, que percebes de andamentos e tal, e começo a ver o que escrevo de outra forma. E.
Jinhos.
aaahhh!!! Cuidado! Espero que tenham sido obras para melhor! Porque senão mais vale ficar qu'eto...
Nas casas como na vida...
Jinho
Té
Teté,
Obras de restauro, mending broken pieces, replacing, reordering, reorganizing, keeping the good stuff longer, the good stuff for long, the good stuff for goos ;), you know...
Jinhos, querida mana.
*the good stuff for good :D
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