terça-feira, setembro 01, 2009

Ui, não!

Então, hoje trouxe o maior coração do mundo ao peito, aquele que comprei no Chiado uma vez ao Senhor Eloy, depois de todas as recomendações sobre o tamanho, depois de todas as prelecções sobre a desmesura, depois das sugestões mais ou menos desesperadas do senhor Eloy – o dedo indicador do senhor Eloy a apontar na montra este, menina, então e este?, não prefere?, de certeza, menina?. Não, com a exclamação, o peso, a força, diminuídos todos pelo sorriso; um sorriso largo a embrulhar a negativa – é sempre tão bonito quem nos chama menina!...

O senhor Eloy não conhece a menina que quando compra, é irrevogavelmente, é a pontilhar o -i- de destino, as alternativas todas lá fora, à porta, as sugestões todas, quietas, do outro lado do balcão. O senhor Eloy não sabe da menina que, quando se encosta ao dito balcão e se inclina a olhar melhor, é porque já tomou posse, e há muito, com todos os outros sentidos, daquilo que, há muito, desde aquela primeira hora, na montra. O senhor Eloy não sabe mas teve a delicadeza de assentir, muito bem, menina, e embrulhar – à séria e ainda mais delicadamente do que o seu imediato assentimento polido – que ainda que seja para si, menina, uma prenda é sempre uma prenda.

Uma prenda é sempre uma prenda. Não sei bem o que o senhor Eloy quis dizer com isto. Sei que há nas prendas a probabilidade mais ou menos certa de elas nos darem um sorriso novo – é assim quando somos miúdos –, é assim antes de nós sermos adultos e o Natal ser sempre que quisermos e os aniversários também, tantas vezes ao longo do ano, todos os dias – quem dera! – excepto no próprio... O senhor Eloy devia querer dizer-me que prenda que é prenda, pode ser prenda mesmo quando é de nós para nós, tem o condão de nos fazer um bocadinho, e por momentos, felizes. Se calhar foi por isso que esta manhã, sem mais, decidi pô-lo ao pescoço. Se calhar não foi por isso, se calhar foi porque o top é castanho-terra e o fio do coração, curiosamente, também. Se calhar, ainda, não foi por nenhuma das razões acima; se calhar foi porque Agosto acabou finalmente e no finalmente em que cada Agosto acaba, recomeço a viver. (E diz que para isso é preciso um coração. Nem que seja fora do peito, nem que seja a pender do pescoço, nem que seja oco, e de prata.)

A meio da manhã desta manhã de Setembro, relembro-me que é Setembro, tempo de não adiar o regresso à Faculdade, a ver se é desta que Biblioteca de lá está aberta, que Agosto foi mês de tudo menos férias, de tudo menos trabalho, de tudo menos aqueles livros, aquela pilha de livros que vejo com sobre-humana nitidez de todas as vezes, sempre, quando calha de fechar os olhos, um, dois livros que se amontoaram oito, doze, na lista que cresceu, cresceu, cresceu, dos livros amontoados aos livros a requisitar, cresceu, exactamente como eu queria que crescessem os dias e o sol e a minha disposição para esses mesmos dias e para o sol.

Doutora Joana, que grande coração!, está apaixonada?! Eu, Ui, não!, eu sem perceber o nexo de causalidade, eu a perguntar-me se o senhor Eloy conheceria o meu interlocutor, eu a esquecer-me de perguntar das férias a quem as tem realmente, eu a pensar no senhor Eloy – o dedo indicador do senhor Eloy a apontar na montra este, menina, então e este?, não prefere?, de certeza, menina? –, eu a ouvir o senhor Eloy dizer de certeza, menina?, uma prenda é sempre uma prenda, eu a tentar descortinar o condão das prendas, destas prendas que damos a nós próprios para uso depois de finalmentes de Agostos e outros meses em que o castanho-terra do fio vai bem com o castanho do top.

Enfim.

4 comentários:

Ouriço-Cacheiro disse...

Tenho um, pequeno mas vistoso, vidro veneziano, vermelho indiscritivel, que uso descaramente junto ao pescoço em dias de Outono ou de Inverno. Por ele, sim, estou perdidamente apaixonada desde que o vi naquela montra abandonado.
;-)

Joana disse...

Ouriço,

Entendemo-nos, portanto. ;)




Jinhos.

Maria Rita disse...

Sabes uma coisaa? Acho que o teu coração deve ser lindo, tanto como o que vestes todos os dias, Inverno ou verão, Agosto ou Setembro. :)

Beijinhoo

Joana disse...

Frida,

Oh! Então e o de quem comenta assim? Lindo, no mínimo... ;)




Jinhos.