Ontem fiz anos. Vinte e cinco. Um quarto de século.
Talvez a isso se deva a minha recente introversão, a angústia ansiosa e a inquietação que se tem prolongado para além do razoável. Como se algo interior exigisse de mim um balanço.
Que fizeste? Que construiste? Que possuis? Muito? Pouco? Algo? Nada? O quê?
Às vezes, quando recordo as minhas amigas mais próximas e demais colegas de curso que já casaram (ou o farão daqui a nada), que vão “casando” mesmo em casa dos pais, que estão a dar aulas, que não estão a dar aulas mas trabalham, que têm um salário fixo ao fim do mês, … nessas alturas penso que não fiz nada, não construí nada, não tenho nada. E a minha vida é de uma sensaboria incomensurável: os dias são cinzentos e abafados, a rotina desesperante, os meus pares desinteressantes e nem eu própria consigo aturar o meu mau feitio.
Outras vezes, quando recebo um mail ou uma sms de um antigo aluno, quando um me encontra por acaso no Hi5, na rua, no Centro Comercial … então os meus dias ganham cor. Todas as cores possíveis e imaginárias. Tudo faz sentido. Tenho a certeza de que posso não ter muito mas construí uma coisa absolutamente preciosa, inefável, que não sei nomear, mas de que me orgulho. Profundamente.
Ontem passei quase todo o dia no Messenger. Recebi milhentos mails e mensagens e entre elas uma sms de Parabéns do Nicolas, meu “ex-aluno”, como o próprio se auto-intitula. Todos os anos é assim. Todos os anos o visito também. Mas este ano teve um sabor especial porque estou longe, ficando a visita portanto adiada para finais de Maio.
Comecei a dar aulas aos vinte e um e terminei o ano passado. Leccionei no Ensino Básico, no Secundário e no Superior. Estive a fazer contas e pela minha vida, pelo meu entendimento e discernimento, e pelo meu coração já passou o futuro cerca de 110 pessoas. Em apenas três anos.
Podia agora discorrer acerca do estado actual da Educação em Portugal, eterna paixão adiada até às kalendas gregas; de como o sistema é injusto, redutor e inadequado; da descredibilização social da classe docente; de como existem professores incompetentes ou simplesmente sem vocação. Podia, mas não vou. Conheço a realidade por dentro e admito que todos os factores que enumerei existem. Infelizmente. Mas não vou perder tempo com isso, até porque para mim a Educação é/deve ser aluno-cêntrica. E note-se que no panorama negro que tracei não falo em indisciplina discente. Considero que isso não existe. É claro que tenho a plena consciência de que esta afirmação é chocante para muita gente que me vai logo atirar à cara com a minha pouca experiência; mas o que é facto é que durante a minha curtíssima incursão pelo sistema de ensino português conheci de facto muita gente, bons e maus profisionais, sim, existem efectivamente professores incompetentes, malformados, mesquinhos, deparei-me com um sistema que prejudica e penaliza tanto os professores, como os alunos, tive muitas vezes que me dominar para não responder em conformidade às pessoas que me sorriam com condescendência ou cinicamente ou secamente quando sabiam qual era a minha profissão… mas nunca conheci um aluno indisciplinado. Conheci, todavia, muitos com carências afectivas. Muitos.
No meu ano de estágio tive muita sorte, dizem-me vozes distantes, cobiçosas. Só porque a minha turma de nono ano tinha catorze alunos e a de oitavo era a melhor do ensino básico da escola. Claro que se esquecem que os catorze alunos dispunham de um conhecimento mediano das matérias, eram muito fracos na língua materna, profundamente desinteressados e absolutamente influenciados pelo líder da turma: o H., um adolescente de dezassete anos, problemático, profundamente inseguro e portanto rebelde, modelo e inspiração os rapazes de treze e catorze anos da turma, louca paixão das meninas da mesma idade. Um adolescente que, como a maioria dos adolescentes, tinha uma inconveniente paixoneta (nº1) pela professora. Claro que se esquecem que os alunos da outra turma, a melhor da escola, eram trinta (!) e tinham Português, a minha aula, no pior horário possível: às cinco da tarde, imediatamente a seguir à aula de Educação Física. E pensam que tudo foi sempre fácil, que nunca me zanguei, que nunca levantei o tom, que nunca mandei ninguém para fora da sala de aula refrescar as ideias.
… Que tudo era perfeito. Não era. Nunca é no início. Mas acaba sempre por ser.
Porventura ajudou o facto de ser muito maternal, possivelmente por ser a mais velha de quatro irmãos, possivelmente ajudou o facto de ser muito jovem e nada influenciável, de estar em início de carreira e ter a energia e a ousadia de ver as situações de uma perspectiva diferente, mais próxima.
O ano passado voltei a ter uma turma de trinta alunos, de sétimo ano, ao último tempo da tarde, com um líder adolescente de dezassete anos, rebelde, com uma paixão inconveniente (nº2) pela professora (quase COPY PASTE de cima) e voltei a ter uma turma de nono ano, desta feita com vinte e alguns alunos, desta feita a pior da escola: a mais terrível e temida, a razão para um atestado médico por depressão da colega anterior, a razão para três processos disciplinares, a razão para o choro frequente, por ofensas verbais, da auxiliar de educação do bloco… uma turma DAQUELAS. Que não se esquecem. Que não se querem esquecer. Vinte e quatro miúdos desinteressados, provocadores, inteligentes, mas no fim absolutamente maravilhosos e adoráveis! Claro que nem tudo foi fácil. Não entrei na sala de aula a sorrir e nem sequer lhes dei oportunidade para entrarem no tão ambicionado diálogo comigo. Falei eu, apenas eu, mas não aos berros, nunca. Primeiro disse que não os conhecia, portanto não tinha nenhuma imagem formada, disse que era suficientemente inteligente para tecer eu as minhas conclusões a respeito deles. Falei de regras, de direitos, de deveres. Mandei-os ler alto, um a um, alternadamente, muitas vezes. Fiz-lhes muitas perguntas, dificílimas, de sinonímia, morfologia e sintaxe, e cada resposta era registada no registo no caderno, à minha maneira, como modelo para as respostas dos testes. Fartaram-se de escrever naquela nossa primeira aula! Queixaram-se dos pulsos, dos cadernos que se iam gastar muito rápido, da economia familiar que não ia suportar despesas extra. Mas aprenderam e descobriram. Muito. Aprenderam que eu não me compadecia deles, não ligava a essas minudências, perceberam quem dirigia o curso dos acontecimentos em aula, quem perguntava, quem respondia, perceberam que afinal não sabiam muito - havia muito para saber. Descobriram que o tempo passa depressa quando estamos ocupados com várias actividades diferentes, interessantes, desafiadoras; descobriram que afinal até sabiam umas coisas e isso levava-os a mais facilmente perceber outras, descobriram que Português não é uma disciplina aborrecida. E que a professora, que quando se chateia é pior que o “Sapinho” dos Morangos, gosta muito deles, porque não ligou à fama e aos boatos e apostou neles. Viu o melhor deles. Tornou-os melhores.
Os meus alunos da faculdade nunca me deram problemas destes, claro está. Mas deram-me outros. Demasiada proximidade. Etária, ideológica, humana. E uma paixão inconveniente (nº3) pela professora (quase COPY PASTE de cima) continua a ser (é sempre!) inconveniente (será Karma?). Seja em que idade for, seja em que grau de ensino for.
Mas hoje é o dia do Nicolas. PARABÉNS!!! Bem vindo à maioridade!
O Nicolas é uma das pessoas que mais marcou a minha vida. Profissional e em geral. É com muito orgulho e uma estima sem fim que lhe reservo um lugar muito especial no meu lado esquerdo do peito. Foi um dos alunos da minha primeira turma de nono, do ano de estágio.
Era (e é) francófono, tão inteligente quanto preguiçoso, irrequieto por vezes, mas dos melhores da turma na generalidade das disciplinas. Sabia disso e portanto calculava, mediante as exigências de cada disciplina e o carácter de cada “prof”, o quanto deveria trabalhar para atingir pouco mais que a mediania. Todavia, tudo acabaria por mudar ao longo do ano…
Não sei se foram os deuses ou simplesmente o acaso que conspirou contra nós (ou a favor…) mas o que é certo é que certo dia, aquele miúdo, que normalmente até era amoroso e que até chamava o adolescente líder da turma à razão, de quando em vez, em contextos extra-aula, estragara-me os noventa minutos de leccionação por completo. Intervenções incovenientes, a recusa em ler, em registar no caderno os conteúdos da aula, a constante tentativa de distrair os colegas em redor, o maior número de colegas possível… enfim, tudo o que o outro faria sem pejo e que agora até para esse era chocante. Não tive outra alternativa (não ma deu!) senão isolá-lo ao fundo da sala, prosseguindo então a aula com normalidade. Escusado será dizer que assim que tocou para sair, o senhor Nicolas, que tinha sido o primeiro a arrumar as suas coisas para sair e se preparava para abrir a porta, foi advertido de que o intervalo teria que esperar porque a professora precisava de falar com ele. Amuou, mas permaneceu ali, à minha frente, de olhar no chão, embaraçado e triste, com uma tristeza muito maior que o arrependimento pelo caos gerado na aula. Na verdade, porque tratei de sanar, isolando, o foco de instabilidade, a aula nem tinha corrido muito mal e então, sem explicação, quase reflexivamente, saiu-me: “Então, conte-me lá, o que é que se passa consigo?” E não é que contou mesmo? Palavras santas, palavras mágicas. Para minha grande admiração (leia-se surpresa e estima), respondeu à pergunta com a mesma espontaneidade, na mesma pureza e com verdade. Uma situação familiar complicada, um coraçãozinho de treze anos partido de fresco, as dúvidas existenciais típicas da adolescência e imensas hormonas a atrapalharem o raciocínio e a ofuscarem a percepção das soluções…
… E do alto dos seus vinte e um anos e da sua larga inexperiência profissional a jovem professora percebeu que a formação para a vida e o desenvolvimento da inteligência social é muito mais importante que a distinção entre orações relativas substantivas e completivas integrantes (e nunca deixei ficar nenhum conteúdo por leccionar!). Porque o desenvolvimento integral da pessoa humana que o professor tem como missão é uma coisa absolutamente simples de se fazer se o amor, o carinho, a compreensão e a solidariedade estiverem lá, junto ao punho que corrige os testes, junto à voz que chama à atenção mas também incentiva e elogia, junto à mão que gesticula, pede silêncio, demonstra e interroga.
Desde aquele momento desenvolvemos uma cumplicidade que, com o passar do tempo, se transformou numa amizade que perdura. É meu amigo. E tenho imenso orgulho nisso e nele. Agradeço a Deus o facto de o ter posto no meu caminho. Enriqueceu-me. Espero ter contribuído também para o seu percurso pessoal e profissional. Sei que sim. Já mo disse. Quando for um arquitecto de renome, será com profunda alegria que direi “Foi meu aluno. É meu amigo.” Tal como outros, tantos, que outras histórias hão-de dar a conhecer.
Agora, à distância de anos, um continente, um oceano e milhões de quilómetros, de todos os meus alunos guardo boas recordações. Dos rebeldes, dos inoportunos, dos apaixonados, das aplicadas, dos bajuladores, dos certinhos, dos tímidos, das faladoras, das sorridentes, das sonhadoras, dos inseguros, dos atletas, dos galãs, dos associativos, dos djs, das meninas, dos meninos, dos agora senhores professores, de todos.
Como para tudo na vida, há que encontrar a chave certa que lhes abre o coração e desperta a mente. Como tudo na vida, se olharmos as pessoas directamente, nos olhos, e lhes falarmos com calma e segurança a verdade, não há indisciplina ou agressividade que resistam.
Talvez a isso se deva a minha recente introversão, a angústia ansiosa e a inquietação que se tem prolongado para além do razoável. Como se algo interior exigisse de mim um balanço.
Que fizeste? Que construiste? Que possuis? Muito? Pouco? Algo? Nada? O quê?
Às vezes, quando recordo as minhas amigas mais próximas e demais colegas de curso que já casaram (ou o farão daqui a nada), que vão “casando” mesmo em casa dos pais, que estão a dar aulas, que não estão a dar aulas mas trabalham, que têm um salário fixo ao fim do mês, … nessas alturas penso que não fiz nada, não construí nada, não tenho nada. E a minha vida é de uma sensaboria incomensurável: os dias são cinzentos e abafados, a rotina desesperante, os meus pares desinteressantes e nem eu própria consigo aturar o meu mau feitio.
Outras vezes, quando recebo um mail ou uma sms de um antigo aluno, quando um me encontra por acaso no Hi5, na rua, no Centro Comercial … então os meus dias ganham cor. Todas as cores possíveis e imaginárias. Tudo faz sentido. Tenho a certeza de que posso não ter muito mas construí uma coisa absolutamente preciosa, inefável, que não sei nomear, mas de que me orgulho. Profundamente.
Ontem passei quase todo o dia no Messenger. Recebi milhentos mails e mensagens e entre elas uma sms de Parabéns do Nicolas, meu “ex-aluno”, como o próprio se auto-intitula. Todos os anos é assim. Todos os anos o visito também. Mas este ano teve um sabor especial porque estou longe, ficando a visita portanto adiada para finais de Maio.
Comecei a dar aulas aos vinte e um e terminei o ano passado. Leccionei no Ensino Básico, no Secundário e no Superior. Estive a fazer contas e pela minha vida, pelo meu entendimento e discernimento, e pelo meu coração já passou o futuro cerca de 110 pessoas. Em apenas três anos.
Podia agora discorrer acerca do estado actual da Educação em Portugal, eterna paixão adiada até às kalendas gregas; de como o sistema é injusto, redutor e inadequado; da descredibilização social da classe docente; de como existem professores incompetentes ou simplesmente sem vocação. Podia, mas não vou. Conheço a realidade por dentro e admito que todos os factores que enumerei existem. Infelizmente. Mas não vou perder tempo com isso, até porque para mim a Educação é/deve ser aluno-cêntrica. E note-se que no panorama negro que tracei não falo em indisciplina discente. Considero que isso não existe. É claro que tenho a plena consciência de que esta afirmação é chocante para muita gente que me vai logo atirar à cara com a minha pouca experiência; mas o que é facto é que durante a minha curtíssima incursão pelo sistema de ensino português conheci de facto muita gente, bons e maus profisionais, sim, existem efectivamente professores incompetentes, malformados, mesquinhos, deparei-me com um sistema que prejudica e penaliza tanto os professores, como os alunos, tive muitas vezes que me dominar para não responder em conformidade às pessoas que me sorriam com condescendência ou cinicamente ou secamente quando sabiam qual era a minha profissão… mas nunca conheci um aluno indisciplinado. Conheci, todavia, muitos com carências afectivas. Muitos.
No meu ano de estágio tive muita sorte, dizem-me vozes distantes, cobiçosas. Só porque a minha turma de nono ano tinha catorze alunos e a de oitavo era a melhor do ensino básico da escola. Claro que se esquecem que os catorze alunos dispunham de um conhecimento mediano das matérias, eram muito fracos na língua materna, profundamente desinteressados e absolutamente influenciados pelo líder da turma: o H., um adolescente de dezassete anos, problemático, profundamente inseguro e portanto rebelde, modelo e inspiração os rapazes de treze e catorze anos da turma, louca paixão das meninas da mesma idade. Um adolescente que, como a maioria dos adolescentes, tinha uma inconveniente paixoneta (nº1) pela professora. Claro que se esquecem que os alunos da outra turma, a melhor da escola, eram trinta (!) e tinham Português, a minha aula, no pior horário possível: às cinco da tarde, imediatamente a seguir à aula de Educação Física. E pensam que tudo foi sempre fácil, que nunca me zanguei, que nunca levantei o tom, que nunca mandei ninguém para fora da sala de aula refrescar as ideias.
… Que tudo era perfeito. Não era. Nunca é no início. Mas acaba sempre por ser.
Porventura ajudou o facto de ser muito maternal, possivelmente por ser a mais velha de quatro irmãos, possivelmente ajudou o facto de ser muito jovem e nada influenciável, de estar em início de carreira e ter a energia e a ousadia de ver as situações de uma perspectiva diferente, mais próxima.
O ano passado voltei a ter uma turma de trinta alunos, de sétimo ano, ao último tempo da tarde, com um líder adolescente de dezassete anos, rebelde, com uma paixão inconveniente (nº2) pela professora (quase COPY PASTE de cima) e voltei a ter uma turma de nono ano, desta feita com vinte e alguns alunos, desta feita a pior da escola: a mais terrível e temida, a razão para um atestado médico por depressão da colega anterior, a razão para três processos disciplinares, a razão para o choro frequente, por ofensas verbais, da auxiliar de educação do bloco… uma turma DAQUELAS. Que não se esquecem. Que não se querem esquecer. Vinte e quatro miúdos desinteressados, provocadores, inteligentes, mas no fim absolutamente maravilhosos e adoráveis! Claro que nem tudo foi fácil. Não entrei na sala de aula a sorrir e nem sequer lhes dei oportunidade para entrarem no tão ambicionado diálogo comigo. Falei eu, apenas eu, mas não aos berros, nunca. Primeiro disse que não os conhecia, portanto não tinha nenhuma imagem formada, disse que era suficientemente inteligente para tecer eu as minhas conclusões a respeito deles. Falei de regras, de direitos, de deveres. Mandei-os ler alto, um a um, alternadamente, muitas vezes. Fiz-lhes muitas perguntas, dificílimas, de sinonímia, morfologia e sintaxe, e cada resposta era registada no registo no caderno, à minha maneira, como modelo para as respostas dos testes. Fartaram-se de escrever naquela nossa primeira aula! Queixaram-se dos pulsos, dos cadernos que se iam gastar muito rápido, da economia familiar que não ia suportar despesas extra. Mas aprenderam e descobriram. Muito. Aprenderam que eu não me compadecia deles, não ligava a essas minudências, perceberam quem dirigia o curso dos acontecimentos em aula, quem perguntava, quem respondia, perceberam que afinal não sabiam muito - havia muito para saber. Descobriram que o tempo passa depressa quando estamos ocupados com várias actividades diferentes, interessantes, desafiadoras; descobriram que afinal até sabiam umas coisas e isso levava-os a mais facilmente perceber outras, descobriram que Português não é uma disciplina aborrecida. E que a professora, que quando se chateia é pior que o “Sapinho” dos Morangos, gosta muito deles, porque não ligou à fama e aos boatos e apostou neles. Viu o melhor deles. Tornou-os melhores.
Os meus alunos da faculdade nunca me deram problemas destes, claro está. Mas deram-me outros. Demasiada proximidade. Etária, ideológica, humana. E uma paixão inconveniente (nº3) pela professora (quase COPY PASTE de cima) continua a ser (é sempre!) inconveniente (será Karma?). Seja em que idade for, seja em que grau de ensino for.
Mas hoje é o dia do Nicolas. PARABÉNS!!! Bem vindo à maioridade!
O Nicolas é uma das pessoas que mais marcou a minha vida. Profissional e em geral. É com muito orgulho e uma estima sem fim que lhe reservo um lugar muito especial no meu lado esquerdo do peito. Foi um dos alunos da minha primeira turma de nono, do ano de estágio.
Era (e é) francófono, tão inteligente quanto preguiçoso, irrequieto por vezes, mas dos melhores da turma na generalidade das disciplinas. Sabia disso e portanto calculava, mediante as exigências de cada disciplina e o carácter de cada “prof”, o quanto deveria trabalhar para atingir pouco mais que a mediania. Todavia, tudo acabaria por mudar ao longo do ano…
Não sei se foram os deuses ou simplesmente o acaso que conspirou contra nós (ou a favor…) mas o que é certo é que certo dia, aquele miúdo, que normalmente até era amoroso e que até chamava o adolescente líder da turma à razão, de quando em vez, em contextos extra-aula, estragara-me os noventa minutos de leccionação por completo. Intervenções incovenientes, a recusa em ler, em registar no caderno os conteúdos da aula, a constante tentativa de distrair os colegas em redor, o maior número de colegas possível… enfim, tudo o que o outro faria sem pejo e que agora até para esse era chocante. Não tive outra alternativa (não ma deu!) senão isolá-lo ao fundo da sala, prosseguindo então a aula com normalidade. Escusado será dizer que assim que tocou para sair, o senhor Nicolas, que tinha sido o primeiro a arrumar as suas coisas para sair e se preparava para abrir a porta, foi advertido de que o intervalo teria que esperar porque a professora precisava de falar com ele. Amuou, mas permaneceu ali, à minha frente, de olhar no chão, embaraçado e triste, com uma tristeza muito maior que o arrependimento pelo caos gerado na aula. Na verdade, porque tratei de sanar, isolando, o foco de instabilidade, a aula nem tinha corrido muito mal e então, sem explicação, quase reflexivamente, saiu-me: “Então, conte-me lá, o que é que se passa consigo?” E não é que contou mesmo? Palavras santas, palavras mágicas. Para minha grande admiração (leia-se surpresa e estima), respondeu à pergunta com a mesma espontaneidade, na mesma pureza e com verdade. Uma situação familiar complicada, um coraçãozinho de treze anos partido de fresco, as dúvidas existenciais típicas da adolescência e imensas hormonas a atrapalharem o raciocínio e a ofuscarem a percepção das soluções…
… E do alto dos seus vinte e um anos e da sua larga inexperiência profissional a jovem professora percebeu que a formação para a vida e o desenvolvimento da inteligência social é muito mais importante que a distinção entre orações relativas substantivas e completivas integrantes (e nunca deixei ficar nenhum conteúdo por leccionar!). Porque o desenvolvimento integral da pessoa humana que o professor tem como missão é uma coisa absolutamente simples de se fazer se o amor, o carinho, a compreensão e a solidariedade estiverem lá, junto ao punho que corrige os testes, junto à voz que chama à atenção mas também incentiva e elogia, junto à mão que gesticula, pede silêncio, demonstra e interroga.
Desde aquele momento desenvolvemos uma cumplicidade que, com o passar do tempo, se transformou numa amizade que perdura. É meu amigo. E tenho imenso orgulho nisso e nele. Agradeço a Deus o facto de o ter posto no meu caminho. Enriqueceu-me. Espero ter contribuído também para o seu percurso pessoal e profissional. Sei que sim. Já mo disse. Quando for um arquitecto de renome, será com profunda alegria que direi “Foi meu aluno. É meu amigo.” Tal como outros, tantos, que outras histórias hão-de dar a conhecer.
Agora, à distância de anos, um continente, um oceano e milhões de quilómetros, de todos os meus alunos guardo boas recordações. Dos rebeldes, dos inoportunos, dos apaixonados, das aplicadas, dos bajuladores, dos certinhos, dos tímidos, das faladoras, das sorridentes, das sonhadoras, dos inseguros, dos atletas, dos galãs, dos associativos, dos djs, das meninas, dos meninos, dos agora senhores professores, de todos.
Como para tudo na vida, há que encontrar a chave certa que lhes abre o coração e desperta a mente. Como tudo na vida, se olharmos as pessoas directamente, nos olhos, e lhes falarmos com calma e segurança a verdade, não há indisciplina ou agressividade que resistam.
5 comentários:
Muitos parabéns.
És uma pessoa especial. Um beijo grande para ti. :*)
Olha lá, tens e-mail? :P
Não pões nenhum aqui no blog.
xxxiii...k é isto?so falta o numero de telemovel..lolol!n keres o meu?lolol.....JOKING!!
dei..entao..promessas!vou t apresentar aos meus alunos..o guarda redes e n sei kem..ixo..promesas..(e melhor n por nomes..lolol)...nas agora ja n tnho cabelo vermelho..perdia piada toda..ololol!.bjinhs nininha
Nem sabes como este teu post me ajudou. Já dou aulas há 7 anos mais nisto de DT ainda sou fresquinha e preciso mesmo de aprender a dominar os alunos sem recorrer ao levantar a voz, às ameaças e a coisas parecidas.
Obrigada pela visita ao meu blog.
Fica bem
Seu relato vem de encontro ao que tenho desenvolvido em minha monografia sobre Indisciplina. se todos os professores consguissem enxergar os corações de seus alunos, indisciplina seria um termo em desuso. Mas não é...
Deus te ilumine sempre!!!
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