1) É grave, Teté?
Há quase um mês que não durmo direito (leia-se mais que duas horas seguidas, mais quatro horas por noite). Há três semanas que tudo o que durmo é feito de pesadelos, cada um mais tenebroso que o outro, uma manta deles feita de retalhos do dia-a-dia.
Continuo a embirrar com esta comida horrosa que é so sal e gordura e por isso como muito mal (leia-se as coisas erradas em quantias absurdas, as coisas certas em quantias ridículas).
Passo o dia cansada, com imensas dores nas costas, sem paciência nem energia. Consequentemente, presumo.
Tenho uma dor de cabeça que não me larga e consegue como poucas coisas me tirar do sério. Como se tivesse um gong em cada têmpora, o que me rouba a razão e a serenidade, o equilíbrio.
Preciso de... um par de óculos?
2) Como é que Édipo espiou a culpa?
O que é que se faz a alguém que nos persegue com aquele olhar que nos deixa à boa maneira da Vénus do Boticelli, mão na mão, cabecinha no ombro da namorada, em plena missa?
Do início. Eu até conheco o rapazito, ou melhor, já tinha dado pela existência do dito o semestre passado. Sempre que ia aos GSA BBQs (i.e. barbecues de graduate students) ele estava lá. Sozinho. E eu fugia-lhe. E costumava (ele) ir à missa com outras duas raparigas. E eu fugia-lhe. Não consigo explicar porquê. Não costumo fazer isso por se ter demonstrado ao longo dos tempos contraproducente. Quanto mais lhes fugimos... Bem, não costumo fazer isso. A não ser, claro, que a tal me aconselhe o meu sexto sentido... o que acontece a maior parte das vezes precisamente quando não quero fugir, mas enfim... Voltei a encontrá-lo numa das últimas sextas-feiras no primeiro GSA BBQ deste ano lectivo. E novamente o olhar. E novamente lhe fugi. Só aí me apercebi de que não tinha (ele) ido à missa ate então, mas depois desse BBQ, no Domingo, já lá estava. Sozinho. Novamente o tal do olhar. Making a long story short, hoje com a namorada mostrou-me porque gosto tanto deste meu sexto sentido. (É certo que reclamo contra isso muitas vezes, possivelmente demasiadas.) Dá-me muito jeito. Hoje também retribui-lhe os olhares não certamente com o que ele queria mas com o que merecia e já estava a pedir há muito, tadinho... Agora só se for muito estúpido, o que também não me surpreenderia de todo, é que me obriga a mostrar-lhe como é que o Édipo espiou a culpa.
Estou piurça!!!
3) Run, Forrest, run!
Ontem vi na rubrica Saturday night Classics da TNT um dos meus filmes predilectos: Forrest Gump. Porque a cada passo me emociono com a sabedoria e a capacidade de tocar tantas vidas de uma maneira tão bonita que só aquela personagem tem. Porque de cada vez que alguem lhe diz "Are you stupid?" penso em mim. Nas pessoas que ja passaram pela minha vida, naquele miúdo que tinha uma família disfuncional e me fez das aulas um inferno, naquela que se apegou a mim de uma maneira pouco saudável, no NEE ao canto, no fundo da sala, no que não conseguia escrever uma letra que fosse sem que eu estivesse ao lado dele... Penso em mim. Quando era miúda e pouco falava, observava só, e os amigos da e a própria família foi consensual: "... algum atraso anda para ali". Porque é que a diferenca é antes de mais um atraso? Quando estava na escola primária e antes de puxarem por mim e me por forçarem a não ser gentil e deixar os meninos que não sabem tirarem dúvidas e aprenderem, antes de ser a melhor da turma, era a miúda com um problema, aquela quietinha, caladinha, a que nunca fala. Quando estava no quinto ano e antes dos primeiros testes, antes de ser a melhor da turma, e a participação nula em aula me tinha dado negativa a todas as disciplinas. Penso em mim. Nestas e noutras tantas situações...
"Stupid is who stupid does." - my mama always told me...
4) Sou filha de um “Português Exemplar”
Até há bem pouco tempo não fazia ideia que havia uma Medalha de Mérito para o Exército que se destina aos efectivos que durante a carreira militar não cometeram nenhum delito, não tendo sido nunca alvo de qualquer inquérito ou punição disciplinar, portanto.
Esta medalha foi atribuída ao meu pai a semana passada. Resultado: Festarola. Dentro dos limites impostos pelos cerca de 1800 kms2 de distância da maioria, claro. Por miúdos: Telefonemas da prole, tele-felicitações, tele-beijinhos e tele-abracinhos. (Quanto às felicitações por parte da minha mãe não me pronunciarei. Obviamente.) Minutos depois, já em animada conversa com a minha mãe, pergunta a minha irmã mais nova, do alto do seus dezanove anos, com a argúcia que desde sempre tão bem a caracteriza: “E aumento no ordenado, não? Quando um universitário é premiado pelo mérito, além do diploma recebe um cheque…”
Pois. Sintomático. Da crise dos símbolos na era moderna. Creio.
E vieram-me à memória imagens distantes do colégio, dos meus doze anos e das aulas de Formação Cristã (seria este o nome?) Bem, na catequese (para todos os efeitos era disso que se tratava) aprendemos, aprendi eu pelo menos, que um Sacramento é – e efectiva-se através de – um símbolo, e a Irmã (ou o Padre? Já não me lembro…) obrigava-nos a repetir vezes sem conta “Sacramentos são sinais exteriores que marcam uma realidade interior”. Como sou muito sensível à repetição, a noção e respectiva definição ficaram algures no meu subconsciente e emergiram agora a propósito da lucidez da minha irmã. Resumindo, se um Sacramento é um símbolo, da mesma forma, um símbolo também pode ser um sacramento, pensei. O problema está em que hoje em dia quem quer saber dos Sacramentos. Nem dos símbolos. Ninguém. Não são aliciantes. Não têm atractivos. Por que darão motivação? Não enchem barriga. Não dão aumentos salariais, nem baixam os impostos, nem permitem uma reforma antecipada. Na realidade não dão nada. Mas vêm com uma anilha de papagaio apensa. Seja a anilha a maledicência e a inveja dos não-agraciados, seja a inclusão num grupo ao qual nem todos os agraciados estão preparados para pertencer. Senão pensemos. Quem quer saber de alianças quando recebemo-las três dias depois do início do namoro? Quem quer saber do véu se tem que ir para a mochila à entrada da universidade (especialmente se for a Sorbonne!)? Ou do sari que só se usa nos casamentos de preferência na terra natal? Ou da aliança que vai para o bolso durante a hora do expediente? Ou do hábito religioso que vai na mala porque senão no avião todos olham de canto?...
Furtar-se a envergar um símbolo é quanto a mim ter problemas interiores, possivelmente vergonha de si próprio. Digo eu, que fui dar aulas na Universidade de cachecol do FCP ao pescoço quando ganhámos a Champions. E que fui consequentemente criticada por isso. (Somos uma sociedade com problemas. Está visto.)
Esperar que uma recompensa pecuniária acompanhe um símbolo é a frescura da adolescência a falar mais alto que o drama de um país falido. De tudo. Mas sobretudo de pessoas exemplares. Além do que as melhores coisas da vida são, sempre foram, gratuitas. Descanse o nosso PM (e o meu conterrâneo detentor da pasta da Administração Interna) que me enche de um orgulho imenso, muito maior do que o oceano que nos separa actualmente, saber que aquela pessoa que me ensinou a juntar vogais e consoantes e a ler, que me levou a apanhar amoras, pêras e figos, que me comprava gelados nas festas e que ainda hoje me leva àquela praia nova ou àquele novo café, àquela livraria ou àquele centro comercial que não existia da última vez, conseguiu ao longo dos anos granjear uma admiração que galgou naturalmente as fronteiras dos seus pares. Na verdade, saber que a bonomia que sempre o marcou carácter do meu pai foi reconhecida pelas altas patentes do Exército é, para além de admirável e confortante, um autêntico desafio! A mim que não vivo sem símbolos, sacramentos e rituais, dá-me motivação, esperança no futuro e vontade de seguir pelos mesmos trilhos e deixar florir a genética da exemplaridade. Ao mesmo tempo que me enche de orgulho faz-me feliz. Muito mais do que se lhe tivesse dado um aumento. Nenhum “Português Exemplar” é aumentado em Portugal. E a poucos, muito poucos, é atribuída esta condecoração. Indubitavelmente.
8 comentários:
DEI N TIVE XORRA PA LER!MAS AKI VAI UM GANDE HUG PA MINHA KIDA SIS MAI VELHA..K ADORO!:))) Bjinhs.Nininha
Ehehehehehe... porque é que isso não me surpreende, piquininha? Mea culpa que faço os posts demasiado longos. Jinhos.
P.S. Também te adoro. Sabes.
JJ,
escrevi o meu primeiro post, em Abril, sobre um ponto que focas neste texto...
Quanto ao essencial, concordo contigo.
O do Look Elite Compal??? Eheheheheh... Jinhos. Joana
Lol!!!
Não é esse! lol
É o primeiro, não da página, mas sim editado. Portanto, vais ter de percorrer essa página toda até ao fim... Chama-se "Essa grande medida governamental..."
Sorry pela confusão.
Anabela, agora sim... percebi (e subscrevo)! Ontem - até pensei que fosse do cansaço do fim do dia - não cheguei lá... ;) Jinhos. Joana
Eu li tudo!tudinho...adorei especialmente o rapazinho da missa..Quem ja n passou por isso? Que bom q é esse nosso sexto sentido!
Ehehehehehehe!
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