segunda-feira, fevereiro 09, 2009

De Sábado (I)

O Pedro vai ter um bebé.
O Pedro, meu colega de Doutoramento, vai ter um bebé.
Já me tinha ligado no dia anterior, mais ou menos à hora do lanche, mas eu tenho sempre o telemóvel em vibração e ando estes dias verdadeiramente desnaturada, eu que ando a não estar para pausas ou lanches, a não estar para os amigos que ligam, nem para os do Messenger, nem sequer para os do G-Talk, eu que ando a não ficar as tardes na Biblioteca para aquele cházinho do fim do dia; eu que ando a trabalhar com phones, ao som do ‘Spiegel im Spiegel’ do Arvo Pärt em repeat, e ainda assim pior e menos do que queria, eu que nesse dia, Sábado, anteontem, ao sair do banho, cedo, à hora do costume, quase tropeço sobressaltada por um arranhar vampírico vindo da cozinha; eu que descansei ao ver por fim a luzinha azul do telemóvel a piscar sobre a mesa, a bem dizer a piscar para a cozinha toda.

Nova Mensagem. Pedro. 6h 15m. Ainda 6h 15m? Este Sábado prometia. Oh se! Ora bem: Pedro às 6h 15m, mais uma insónia do Pedro, mais um-a-ti-que-vais-trabalhar-a-estas-horas-indecentes-os-bons-dias-de-quem-vai-ver-se-consegue-dormir-alguma-coisa-agora-que-o-cansaço-finalmente-vem, de certeza. Mas não. ‘Olá, ontem não te consegui apanhar, mas como a estas horas já estás...” Acordada. Estava mesmo, depois daquele arrastar sobre a mesa da cozinha!... “... nada de especial, daqui a sete meses vou ser Papá!”

Pa-pá, o Pedro. O Pedro, meu colega, que se casou no dia de anos da minha mãe, que fez com que eu fosse para a Madeira no dia a seguir aos anos dela que “... filha, eu faço anos todos os anos e o Pedro, Deus queira e ele também, só se deve casar desta vez...”. O Pedro. Papá. Com maiúscula e tudo na sms. Assim: Papá. O Pedro e a Ana vão ter um bebé!

O Pedro e a Ana vão ter um bebé. O Pedro e a Ana vão ter um bebé. O Pedro e a Ana vão ter um bebé!

Ainda há dias falava sobre isso com o e até evito esse assunto – esta é a parte em que o se ri e cospe o écran todo do computador para não se engasgar, se porventura estiver a comer ou a beber alguma coisa – evito MESMO, constrange-me, não gosto. (É algo que quero muito e sou mais excessiva do que desejaria nos quereres.) Além do que as coisas que queremos muito, se forem boas, costumam fazer-se esperar.

Preservando-as, volto ao bebé do Pedro. Depois de molhar o teclado e a parte do lençol de banho que devia dobrar para dentro bem no meu lado esquerdo, depois de uma mensagem em branco e de outra para o número antigo, depois do impacto incial da notícia, lá lhe dei os Parabéns!, e pensando bem... escrevi muita coisa, mas não exactamente Parabéns!, helás, não há impacto que não cause danos; mas ele percebeu, o bom do Pedro é que percebe sempre, sei, especialmente quando leio “És um amor!” – é a espécie de ponto final nas mensagens dele – e é também quando eu fico a pensar no quanto esta expressão pertence a outrém desde o precisamente, no quanto esta expressão devia ser protegida por leis de copyright.

Este é o primeiro ano de Doutoramento do Pedro, o ano em que conseguiu a Bolsa, o ano em que vai para a Bélgica um semestre, o ano em que vai ter um bebé, o primeiro dos cinco (era, não era?) que me lembro de ver saltar para o centro do slide final do Power-Point que apresentaram no fim do jantar do casamento.

Há pessoas que têm vidas perfeitas.

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