Ando a fintar eu por cá. Ando a fintar eu por cá porque não quero escrever o que, com todas as forças, me apetece escrever. E acho que isso é por causa da responsabilidade que traz a amizade. Porque, felizmente para mim, a generalidade das pessoas que comenta aqui são amigas, daquele amigo-mesmo-amigo com quem se partilhou, partilha, partilhará, a vida em momentos: manhãs e tardes de sol, abraços e conversas, um cházinho ou um cafézinho, um jantar ou uma saída.
São-me difíceis, os verões – acabam por sê-lo, enfim, de alguns anos a esta parte. Na realidade, pensando bem, acabam por sê-lo desde que fui para o outro lado de mundo.
Gosto de dizer: Fui para o outro lado do mundo. Mesmo tendo apenas cruzado o Oceano Atlântico, mesmo tendo ido para os EUA, e não para a Austrália ou para Singapura ou para a Tailândia ou para o Tahiti – aqueles locais a que se costuma associar “o outro lado do mundo”. (Na verdade, a maior parte das pessoas não percebe, não sonha sequer, o que é na realidade o outro lado do mundo.)
Às vezes vamos para o outro lado do mundo sem nos mexermos sequer do lugar, e a viagem muda-nos, constrói-nos por dentro, mesmo que nos destrua, sobretudo se nos destrói.
Apesar de este meu ter ido para o outro lado do mundo ter sido da outra espécie – daquela que implica fazer malas, entrar em aviões, trocar de aviões, apanhar comboios e táxis, chegar a novas cidades e casas e pessoas e começar a recomeçar – a viagem por dentro, aquela que nos transfigura especialmente quando estamos quietos, terá começado bem a meio da outra e por razões absolutamente providenciais: o inefável tem caminhos que só o inefável.
São-me difíceis, os verões – acabam por sê-lo sempre, e isto, percebo agora, porque me acordam de uma maneira violenta para a vida. Não sei se ando distraída no resto do ano, se me cegam as ocupações, as pessoas, os deveres e as obrigações do dia-a-dia, se por isso me limito a vivê-lo, o quotidiano, sem pensar muito, sem olhar, tanto quanto devia, para os lados, sem analisar muito, sem julgar muito, replicando quase nada, absorta em palavras escritas, sem visão de conjunto, sem o óbvio, sem dar pelo óbvio.
Às vezes vamos para o outro lado do mundo sem nos mexermos sequer do lugar, e a viagem muda-nos, constrói-nos por dentro, mesmo que nos destrua, sobretudo se nos destrói. Às vezes vamos para o outro lado do mundo nos EUA ou em casa, em frente ao computador ou num abraço, bem a meio ou só na última página de um livro, depois de muito choro ou riso.
As pessoas não sabem, algumas pessoas não sabem, mas o outro lado do mundo não é a Tailândia lá longe no Pacífico, nem é o céu que o mar espelha, fulgurante, estes dias, nem a lua que o sol ilumina quando cai a noite, nem sequer é o Amor, ou o desamor, a decrepitude ou um momento de extâse.
O outro lado do mundo é o outro lado da vida.
Que vamos trilhando pela margem.
Que vamos percorrendo no limite da sede.
Que vamos construindo: dificuldade após certeza, certeza após dificuldade.
Que nos vai pesando da cabeça aos ombros até chegar mais dentro, ao coração.
O outro lado do mundo é o outro lado da vida.
São-me difíceis, os verões – acabam por sê-lo, enfim, de alguns anos a esta parte. Na realidade, pensando bem, acabam por sê-lo desde que fui para o outro lado de mundo.
Gosto de dizer: Fui para o outro lado do mundo. Mesmo tendo apenas cruzado o Oceano Atlântico, mesmo tendo ido para os EUA, e não para a Austrália ou para Singapura ou para a Tailândia ou para o Tahiti – aqueles locais a que se costuma associar “o outro lado do mundo”. (Na verdade, a maior parte das pessoas não percebe, não sonha sequer, o que é na realidade o outro lado do mundo.)
Às vezes vamos para o outro lado do mundo sem nos mexermos sequer do lugar, e a viagem muda-nos, constrói-nos por dentro, mesmo que nos destrua, sobretudo se nos destrói.
Apesar de este meu ter ido para o outro lado do mundo ter sido da outra espécie – daquela que implica fazer malas, entrar em aviões, trocar de aviões, apanhar comboios e táxis, chegar a novas cidades e casas e pessoas e começar a recomeçar – a viagem por dentro, aquela que nos transfigura especialmente quando estamos quietos, terá começado bem a meio da outra e por razões absolutamente providenciais: o inefável tem caminhos que só o inefável.
São-me difíceis, os verões – acabam por sê-lo sempre, e isto, percebo agora, porque me acordam de uma maneira violenta para a vida. Não sei se ando distraída no resto do ano, se me cegam as ocupações, as pessoas, os deveres e as obrigações do dia-a-dia, se por isso me limito a vivê-lo, o quotidiano, sem pensar muito, sem olhar, tanto quanto devia, para os lados, sem analisar muito, sem julgar muito, replicando quase nada, absorta em palavras escritas, sem visão de conjunto, sem o óbvio, sem dar pelo óbvio.
Às vezes vamos para o outro lado do mundo sem nos mexermos sequer do lugar, e a viagem muda-nos, constrói-nos por dentro, mesmo que nos destrua, sobretudo se nos destrói. Às vezes vamos para o outro lado do mundo nos EUA ou em casa, em frente ao computador ou num abraço, bem a meio ou só na última página de um livro, depois de muito choro ou riso.
As pessoas não sabem, algumas pessoas não sabem, mas o outro lado do mundo não é a Tailândia lá longe no Pacífico, nem é o céu que o mar espelha, fulgurante, estes dias, nem a lua que o sol ilumina quando cai a noite, nem sequer é o Amor, ou o desamor, a decrepitude ou um momento de extâse.
O outro lado do mundo é o outro lado da vida.
Que vamos trilhando pela margem.
Que vamos percorrendo no limite da sede.
Que vamos construindo: dificuldade após certeza, certeza após dificuldade.
Que nos vai pesando da cabeça aos ombros até chegar mais dentro, ao coração.
O outro lado do mundo é o outro lado da vida.
14 comentários:
incomentável, este.
um beijinho e um abraço maior. *
Vanessa,
Tudo aceite, e tudo em dobro para ti.
Jinhos.
Nós, seres humanos com mente aberta e sonhadora, é que temos a capacidade de nos transportamos para outro lado qualquer, sem precisar de dar um único passo. O outro lado da vida é também conhecermo-nos até ao ponto em que sabemos até onde podmos ir. =)
Beijinho grande*
Pedro,
Podemos ir até onde quisermos, se o sonho nos comandar a vida. :)))
Jinhos.
"Que nos vai pesando da cabeça aos ombros até chegar mais dentro, ao coração."
O outro lado do Mundo é o sítio onde conseguimos chegar sempre que nos superamos.
Maravilhoso. É o adjectivo que sai depois de ler isto. :)
Um beijinho*
Frida,
"O outro lado do Mundo é o sítio onde conseguimos chegar sempre que nos superamos. "
É mesmo!... E pela segunda vez, que me lembre, tremo ante a exactidão de um comentário teu.
Lês-me tão acertadamente como se tivéssemos escrito isto as duas, como se a minha mão fosse a tua mão. Lindo!
Jinhos.
O caminho é nosso, não o recusemos.
Rui,
Sábias palavras. E um consolo.
É bem verdade, e na primeira pessoa do plural!...
(Nem de propósito, o meu pai dizia-me há pouco de si nos cartazes no Funchal. Boa sorte nesse caminho, também!)
Jinhos.
as palavras evaporam nos teus poros...
a tua foto faz-me recordar um conto do Jacinto Lucas Pires, no livro "Para Averiguar do Seu Grau de Pureza"
Sílvio,
Que foto? (A do perfil?) E, mais importante, que conto? (Qual das treza janelas? :))))))))
Bombardeio-te com perguntas antes de te dar as boas-vindas: Sê bem-vindo!
Bombardeio-te porque um dia, quando for velhinha, perguntar-me-ão quem primeiro-primeiro, e eu: Jacinto Lucas Pires. Sem dúvida.
E mesmo depois, mesmo agora, ve-lo e ouve-lo na televisão e o homem por detrás dos livros e daquele sorriso é tão GRANDE! de simples, sagaz e humano: verdadeiro.
(Gosto do JLP, admiro-o muito, sabes?)
Jinhos.
P.S. Ia já apressar-me a indicar-te o blog do Jacinto Lucas Pires, mas já vi que o tens linkado no teu cantinho. ;)
Sim, a do perfil.
O título do conto não me está a vir à memória, mas é aquele do reflexo do rosto no vidro do comboio..."enamorei-me", "já ninguém diz isso..." lolol
Estive com ele, faz muitos anos, na feira fo livro de Paços de Ferreira...lolol
Sílvio,
Já ninguém diz muita coisa, de facto. Ou melhor, diz-se muita coisa, mas não isso, não assim. Coisas...
Tenho que o reler. :)))))))
Jinhos.
O outro lado do mundo sou eu, porque sou e serei sempre do outro mundo...
Belo blogue.
Parabéns!
Miguel Ângelo
Miguel Ângelo,
Esta agora! É a primeira pessoa do outro mundo que vem cá parar. :)))
Quanto ao resto, obrigada!
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